A Súmula 419/STJ. Carta de alforria para o depositário infiel?

15/04/2010

Por Patricia Costa Agi Couto

Súmula 419/STJ: "Descabe a prisão civil do depositário judicial infiel".

A edição da nova Súmula vem pacificar o entendimento desde há muito adotado pelas Cortes Superiores quanto à impossibilidade de prisão civil do depositário judicial infiel.

A discussão acerca da prisão civil, agora transformada em Súmula, teve origem no julgamento do Habeas Corpus 87585/TO pelo Supremo Tribunal Federal que, em 03/12/08 adotou a seguinte orientação: “DEPOSITÁRIO INFIEL – PRISÃO. A subscrição pelo Brasil do Pacto de São José da Costa Rica, limitando a prisão civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentícia, implicou a derrogação das normas estritamente legais referentes à prisão do depositário infiel.”

Em 02/12/09, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial 914.253-SP adotando posicionamento idêntico: “Processo Civil. Tributário. Recurso Especial representativo da controvérsia. Art. 543-C do CPC. Depositário infiel. Pacto de São José da Costa Rica. Emenda Constitucional nº 45/2004. Dignidade da pessoa humana. Novel posicionamento adotado pela Suprema Corte.”

Se os julgados precursores já orientavam os Tribunais no sentido de que não era mais admissível a prisão civil por dívida – com exceção à obrigação alimentícia –, agora, com a Súmula 419, a questão parece estar sedimentada.

Mas não confunda a abolição da prisão civil para o depositário infiel como alforria para o devedor. Afastou-se, tão somente, a prisão civil. Prevalece a responsabilização criminal. O depositário que deixar de apresentar bens que estejam sob sua guarda e responsabilidade deverá responder pela tipificação penal correspondente, podendo até ser preso se condenado ao final do processo.

O delito, por exemplo, está previsto no artigo 168, §1º, II, do Código Penal,: “Apropriação indébita. Art. 168 – Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção: Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa. Aumento de pena. § 1º – A pena é aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa: (…); II – na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou depositário judicial;(…)”

Confira-se: “PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. GRÃOS EM DEPÓSITO. AUSÊNCIA DE PERÍCIA TÉCNICA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. CONTRATO DE DEPÓSITO. TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE. INOCORRÊNCIA. ANIMUS REM SIBI HABENDI. COMPROVAÇÃO. PRISÃO POR DÍVIDA. INOCORRÊNCIA. ILÍCITO PENAL.” (2003.04.01.036521-8 do TRF4, de 16/12/03)

Tem mais. Artigo 171, inciso II do mesmo diploma legal: “Estelionato. Art. 171, II – Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria (…) II – vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias.

Portanto, não deve subsistir a ideia de impunidade para o depositário infiel que descumpre a sua obrigação. Não há mais, de fato, a possibilidade da prisão civil, aquela em flagrante. Mas a prisão na esfera criminal poderá ocorrer sempre que os delitos aqui mencionados forem violados.

Patrícia Costa Agi Couto
patricia@fortes.adv.br

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