Decisões afirmam validade de Nota Promissória em garantia de vícios de origem em operações de factoring

27/03/2014

Por Cylmar Pitelli Teixeira Fortes

Muito se tem questionado acerca da possibilidade da emissão de nota promissória em garantia ao contrato de factoring. Isso porque, não raras vezes, encontramos posicionamentos que afirmam ser inadmissível a emissão de nota promissória para garantia dessas operações, sob o argumento de que a empresa de fomento mercantil responde pelos riscos de sua atividade, sendo a insolvência um desses riscos.
 
A regra, no entanto, comporta exceções, pois como o contrato de factoring traz elementos da cessão a título oneroso “o cedente, ainda que não se responsabilize, fica responsável ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lhe cedeu”, nos termos do artigo 295 do Código Civil.
 
A respeito do tema, o C. Superior Tribunal de Justiça, no recente julgamento do Recurso Especial n. 1.289.995, de relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, decidiu:
 
DIREITO EMPRESARIAL. DIREITO DE REGRESSO RELACIONADO A CONTRATO DE FACTORING. A faturizadora tem direito de regresso contra a faturizada que, por contrato de factoring vinculado a nota promissória, tenha cedido duplicatas sem causa subjacente. Por um lado, a doutrina é praticamente unânime no sentido de que a faturizadora não tem direito de regresso contra a faturizada com base no inadimplemento dos títulos transferidos, haja vista que esse risco é da essência do contrato de factoring e por ele a faturizada paga preço até mais elevado do que pagaria, por exemplo, em um contrato de desconto bancário, no qual a instituição financeira não garante a solvência dos títulos descontados. Por outro lado, essa circunstância, não tem o alcance de afastar toda e qualquer responsabilidade da cedente em relação à existência do crédito, haja vista que tal garantia é própria da cessão de crédito comum – pro soluto. É por isso que a doutrina, de forma uníssona, afirma que no contrato de factoring e na cessão de crédito ordinária a faturizada/cedente não garante a solvência do crédito, mas a sua existência sim. Cuida-se, na verdade, de expressa disposição legal, nos termos do que dispõem os arts. 295 e 296 do CC. Nesse passo, o direito de regresso da faturizadora contra a faturizada deve ser garantido quando estiver em questão não um mero inadimplemento, mas a própria existência do crédito. Não reconhecer tal responsabilidade quando o cedente vende o crédito inexistente ou ilegítimo representar compactuar com a fraude e má-fé. É bem verdade que há precedentes do STJ que não permitiram o regresso da faturizadora, em situações que, aparentemente, diziam respeito a duplicatas frias. Em todas essas hipóteses, porém, inexiste nota promissória emitida como garantia do negócio jurídico relacionado ao factoring, o que diferencia os julgados do caso em exame. Por sua vez, em reforço à tese ora adotada, há outros precedentes que permitiram, inclusive, o pedido de falência com base na nota promissória recebida como garantia de duplicatas apontadas como frias endossadas a sociedades de factoring.”
 
Essa decisão corrobora o entendimento que já vinha sendo manifestado pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
 
“Embargos à execução de título extrajudicial. Nota promissória emitida em garantia à operação de fomento mercantil. Nas operações de factoring, o faturizador recebe os títulos mediante endosso translativo e assume o risco pela insolvência do devedor, vedando-se o direito de regresso ou a garantia por aval ou endosso, exceto nas hipóteses em que o crédito cedido decorre de negócio jurídico maculado por vício que o invalide. Inteligência do art. 295 do Código Civil. Hipótese em que restou evidenciada a possibilidade de execução da nota promissória emitida para garantia da operação de faturização. Sentença mantida. Recurso negado.” (Apelação n. 0006885-50.2011.8.26.0291, Relator: Des. Francisco Gianquinto, j. 07.05.2013)
 
Como se vê, desde que a nota promissória sirva exclusivamente para a recompra de títulos viciados (“frios”, no jargão do mercado), e não para outras finalidades, como por exemplo a cobrança de encargos contratuais, sua utilização é perfeitamente possível.
 
Assim, não há que se falar em abusividade na exigência de NP emitida em garantia da existência do crédito ao tempo da cessão, pois a constatação de vício de origem não se insere no contexto de risco da atividade do faturizador. Ademais, não se pode admitir que cessão de um título a terceiro, que o adquire de boa-fé, seja utilizada como meio para se auferir recursos com títulos sem causa, ou cuja causa esteja viciada. Isso agrediria o Direito e o bom senso.
 
Cylmar Pitelli Teixeira Fortes
cylmar@fortes.adv.br
 
Camilla Thais Correa Moriki
camilla@fortes.adv.br
 

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