Vinicius de Barros
A regra é que o sócio não responde com seu patrimônio pelas dívidas fiscais da empresa. De acordo com a legislação e a jurisprudência, o sócio deve ser responsabilizado pessoalmente pelas obrigações da sociedade apenas se tiver praticado à frente da empresa algum ato ilegal, doloso ou fraudulento, com o intuito de lesar terceiros, ou se ficar provado que a empresa foi encerrada irregularmente, situação mais comum de acontecer.
O encerramento irregular ocorre quando a empresa deixa de exercer suas atividades, não comunica tal fato aos órgãos competentes, e não honra suas obrigações tributárias. Na prática, tal circunstância é comprovada por meio de oficial de justiça, que a pedido do fisco comparece no endereço que a sociedade declara aos órgãos públicos como sendo de sua sede e certifica ao juiz que a empresa não funciona no local.
E se a empresa encerra suas atividades em razão da sua falência, decretada judicialmente, o sócio deve responder automaticamente pelas obrigações fiscais? Por entender que sim, que a falência gera a responsabilização, o fisco busca receber dos sócios o crédito tributário devido pela empresa. Em grande parte dos casos o sócio só toma conhecimento da sua responsabilização com o bloqueio de suas contas bancárias – o que se espera que não mais aconteça daqui para frente com as mudanças que o novo código de processo introduziu – pois não é incomum os juízes acolherem o pedido do fisco sem se atentarem para as circunstâncias do caso concreto.
Sucede que o sócio de empresa que teve a falência decretada não deve responder pelas obrigações fiscais da sociedade – exceto se restar comprovada a prática de ato ilegal, doloso ou fraudulento, prova que incumbe ao fisco fazer –, pois a falência, em verdade, é forma de encerramento regular da empresa. Esse entendimento é corroborado pelas decisões do Superior Tribunal de Justiça, responsável por julgar o tema em última instância:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. SÓCIO-GERENTE. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. FALÊNCIA. EXIGUIDADE DE BENS. REDIRECIONAMENTO. 1. No STJ o entendimento é de que o simples inadimplemento da obrigação tributária não enseja a responsabilidade solidária do sócio-gerente, nos termos do art. 135, III, do CTN. 2. A falência não configura modo irregular de dissolução da sociedade, pois, além de estar prevista legalmente, consiste numa faculdade estabelecida em favor do comerciante impossibilitado de honrar compromissos assumidos. 3. Em qualquer espécie de sociedade comercial, é o patrimônio social que responde sempre e integralmente pelas dívidas sociais. Com a quebra, a massa falida responde pelas obrigações a cargo da pessoa jurídica até o encerramento da falência, só estando autorizado o redirecionamento da Execução Fiscal caso fique demonstrada a prática pelo sócio de ato ou fato eivado de excesso de poderes ou de infração a lei, contrato social ou estatutos. 4. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 128.924/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/08/2012, DJe 03/09/2012)
TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO DE PAGAR TRIBUTOS. IMPOSSIBILIDADE. FALÊNCIA. 1. O mero inadimplemento da obrigação de pagar tributos não constitui infração legal capaz de ensejar a responsabilidade prevista no artigo 135 do Código Tributário Nacional. Ademais, a quebra da empresa executada não autoriza a inclusão automática dos sócios, devendo estar comprovada a prática de atos com excesso de poderes ou infração à lei. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1273450/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/02/2012, DJe 17/02/2012)
Portanto, a falência em razão do insucesso da empresa não gera, por si só, a responsabilidade do sócio pelas dívidas da sociedade. É o patrimônio social que responde sempre e integralmente pelas dívidas da empresa, e no caso de falência, a massa falida é a responsável pelo pagamento.
Por fim, mesmo em se tratando de encerramento irregular (paralisação das atividades sem comunicar tal fato aos órgãos competentes e honrar suas obrigações tributárias), não é demais lembrar que ainda assim o sócio não necessariamente deve responder pelas dívidas da empresa. Citamos abaixo algumas situações:
a) saída do quadro societário antes do encerramento irregular da empresa:
“EXECUÇÃO FISCAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE DE SÓCIOS. DISSOLUÇÃO IRREGULAR CONFIGURADA. ARTIGO 135, III, DO CPC. SÚMULA 435 STJ. RECURSO PROVIDO. – A inclusão de sócios-gerentes no polo passivo da execução fiscal é matéria disciplinada no artigo 135, inciso III, do CTN. Quando os nomes dos corresponsáveis não constam da certidão da dívida ativa, somente é cabível se comprovados atos de gestão com excesso de poderes, infração à lei, ao contrato, ao estatuto social ou, ainda, na hipótese de encerramento irregular da sociedade. (…) – Para a configuração da responsabilidade delineada na norma tributária como consequência da dissolução irregular é imprescindível a comprovação de que o sócio integrava a empresa quando do fechamento de suas atividades e de que era gerente ao tempo do vencimento do tributo. (…) – Agravo de instrumento provido.” (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, AI 0014410-87.2013.4.03.0000, Rel. JUÍZA CONVOCADA SIMONE SCHRODER RIBEIRO, julgado em 13/02/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/02/2014)
b) não exercício da administração da empresa:
“AGRAVO LEGAL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO – SÓCIO QUE NÃO EXERCIA PODERES DE GERÊNCIA DA SOCEDADE À ÉPOCA DA DISSOLUÇÃO IRREGULAR – IMPOSSIBILIDADE DE INCLUSÃO NO POLO PASSIVO. I – Admite-se o redirecionamento da execução fiscal nos casos em que, comprovada a impossibilidade de garantia da causa pelos meios ordinários, apresentem-se indícios da dissolução irregular da sociedade executada ou das práticas descritas no artigo 135, III. II – De acordo com o entendimento firmado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, adotado também por esta E. Terceira Turma, o redirecionamento da execução deve ocorrer contra os sócios que geriam a empresa na época em que houve sua dissolução irregular. III – Cuidando-se de sócio que não exercia poderes de gerência da sociedade à época da dissolução irregular, descabida a sua inclusão no polo passivo da execução. IV – Precedentes. (…) VIII – Agravo legal improvido.” (TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AI 0010900-37.2011.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MARCONDES, julgado em 16/01/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/01/2014)
c) encerramento das atividades não provocado por dolo ou fraude dos sócios:
“RECURSO ESPECIAL – EXECUÇÃO FISCAL – REDIRECIONAMENTO – DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE CERTIFICADA POR OFICIAL DE JUSTIÇA – CABIMENTO. 1. A certidão do oficial de justiça que atesta o encerramento das atividades da empresa no endereço fiscal é indício de dissolução irregular apto a ensejar o redirecionamento da execução fiscal. Precedentes. 2. A não localização da empresa no endereço fornecido como domicílio fiscal gera presunção iuris tantum de dissolução irregular. Possível, assim, a responsabilização do sócio-gerente, a quem caberá o ônus de provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder. 3. Recurso especial não provido.” (REsp 1344414/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/08/2013, DJe 20/08/2013)
Como se pode notar, mesmo na hipótese de encerramento irregular, há circunstâncias que afastam a responsabilidade do sócio, que devem ser analisadas caso a caso.
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