A desconsideração da personalidade jurídica, basicamente, é medida que permite o alcance de bens de pessoa diversa daquela condenada ou cobrada em juízo, podendo, por exemplo, atingir administradores, sócios ou acionistas da empresa executada, assim como outras pessoas jurídicas ligadas ao grupo econômico da devedora.
O novo Código de Processo Civil (Lei Federal n° 13.105, de 16 de março de 2015), atento à importância desse excepcional instrumento, inovou ao regulamentar a desconsideração como incidente processual. Significou que a pessoa buscada para integrar a cobrança judicial agora deverá ser intimada para se manifestar sobre a pretensão do credor.
Previsto nos artigos 133 a 137 do CPC, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica pode ser instaurado em todas as fases do processo de conhecimento, cumprimento de sentença ou execução de título extrajudicial e deverá observar os pressupostos previstos em lei.
O cabimento da desconsideração levará em consideração a observação das leis aplicáveis ao caso concreto. Nos processos trabalhistas, nas relações entre fornecedor e consumidor, e em casos de danos ao meio ambiente, a desconsideração é aplicada assim que confirmada a inadimplência do devedor principal. Nos casos cíveis-empresariais, no entanto, devem ser observados os requisitos previstos no artigo 50 do Código Civil, que limita a aplicabilidade dessa medida a casos de abuso de personalidade jurídica:
"Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica." [grifo nosso]
Ou seja, a leitura da lei sugere que determinadas condições devem ser preenchidas para o decreto de desconsideração, não sendo suficiente a mera inadimplência da pessoa jurídica devedora.
Essa questão foi objeto de discussão recente, promovida pelo julgamento do Recurso Especial n° 1.729.554/SP, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Para o STJ, “a demonstração da insolvência do executado não é pressuposto para a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica”.
Em seu voto, o relator Ministro Luiz Felipe Salomão observou que tal instituto é relevante porque “colabora com a recuperação de crédito, combate à fraude, fortalecendo a segurança do mercado, em razão do acréscimo de garantias aos credores”, mas ressalvou o cabimento em caso de mera inadimplência.
Em resumo, a insuficiência de bens do devedor – agora mais uma vez reiterada pelo STJ – não pode ser o único requisito para a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Não em causas cíveis e empresariais, que exigem o desvio de finalidade ou a confusão patrimonial.
Bruna Marcela Bernardo Moreira
12 setembro, 2024
21 março, 2024
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