TJSP reconhece que recebíveis não são “bens de capital”

26/09/2018

Por Thaís de Souza França

A Lei 11.101/2005 (Lei de Recuperação Judicial) estabelece no § 3º do artigo 49 que, tratando-se o credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial[1]

É certo que a não sujeição desta categoria de credor aos efeitos da recuperação judicial existe em virtude da importância econômica das atividades previstas no aludido dispositivo, e tem como objetivo assegurar que os custos de tais operações sejam reduzidos no mercado, na medida em que os riscos de não recebimento do crédito pelo credor são mitigados.

Assim, muitas das operações de crédito celebradas com empresas são garantidas pela cessão fiduciária de seus recebíveis, considerados espécies de bens móveis, nos termos do inciso III, do artigo 83 do Código Civil[2].

No entanto, não é incomum que, após a distribuição do pedido de recuperação judicial e obtenção de crédito em condições diferenciadas em virtude da garantia fiduciária celebrada, a recuperanda, muitas vezes revestida por má-fé, tente frustrar o direito do credor fiduciário em receber o seu crédito.  

Felizmente, em recente acórdão de relatoria do desembargador Sérgio Shimura, o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu que os bens de capital mencionados no § 3º do artigo 49 da Lei de Recuperação Judicial, cuja venda e retirada do estabelecimento da recuperanda pelo prazo do stay period [3] é vedada, dizem respeito aos maquinários e equipamentos essenciais à atividade da empresa, e “recebíveis não se encaixam na ideia de bens de capital”, permitindo o prosseguimento de uma execução de título extrajudicial ajuizada por instituições financeiras.

O princípio da preservação da empresa deve ser observado, no entanto, é intolerável que sirva como pretexto para que a cessão fiduciária constituída seja ignorada. A acertada decisão traz esperança para os credores fiduciários nas discussões sobre o tema.

Thaís de Souza França

 


[1] Lei 11.101/2005, artigo 49. “Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. (…) § 3o Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4o do art. 6o desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial”.

[2] Código Civil, artigo 83. “Consideram-se móveis para os efeitos legais: (…) III – os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações”.

[3] Prazo de suspensão dos processos de execução contra a Recuperanda, após o deferimento da recuperação judicial, estabelecido no § 4º do artigo 6º da Lei 11.101/2005: “A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário. (…) § 4o Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial”.

 

 

 

 

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