Por Orlando Quintino Martins Neto
A garantia por alienação fiduciária é muito comum atualmente em financiamentos imobiliários, em substituição à garantia hipotecária que caiu em desuso.
A Lei 9.514/97 (Lei da Alienação Fiduciária), define o credor como “fiduciário” e o devedor como “fiduciante”.
O artigo 27 da Lei 9.514/97, em seu § 8º, diz o seguinte:
“§ 8o. Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse.”
A despeito da disposição expressa da lei, é comum nos depararmos com decisões em que o credor fiduciário foi responsabilizado por débitos condominiais do imóvel alienado.
Para por fim à controvérsia, a Terceira Turma do STJ recentemente proferiu decisão que analisou especificamente a aplicação do § 8º do artigo 27 da Lei 9.514/97, em julgamento do Recurso Especial nº 1.696.038, sob a relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
O acórdão foi assim ementado:
“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONDOMÍNIO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. IMÓVEL. PAGAMENTO. RESPONSABILIDADE. DESPESAS CONDOMINIAIS. DEVEDOR FIDUCIANTE. POSSE DIRETA. ART. 27, § 8º, DA LEI Nº 9.514/1997. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cinge-se a controvérsia a definir se o credor fiduciário, no contrato de alienação fiduciária em garantia de bem imóvel, tem responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais juntamente com o devedor fiduciante. 3. Nos contratos de alienação fiduciária em garantia de bem imóvel, a responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais recai sobre o devedor fiduciante enquanto estiver na posse direta do imóvel. 4. O credor fiduciário somente responde pelas dívidas condominiais incidentes sobre o imóvel se consolidar a propriedade para si, tornando-se o possuidor direto do bem. 5. Com a utilização da garantia, o credor fiduciário receberá o imóvel no estado em que se encontra, até mesmo com os débitos condominiais anteriores, pois são obrigações de caráter propter rem (por causa da coisa). 6. Na hipótese, o credor fiduciário não pode responder pelo pagamento das despesas condominiais por não ter a posse direta do imóvel, devendo, em relação a ele, ser julgado improcedente o pedido. 7. Recurso especial provido.”
Em seu voto, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva menciona:
“De fato, a exegese legal é no sentido de que a obrigação de pagar as contribuições condominiais recai sobre o devedor fiduciante, enquanto ele estiver na posse direta do imóvel. Entretanto, essa responsabilidade passará ao credor fiduciário se ele for imitido na posse. Desse modo, em contrato de alienação fiduciária de bem imóvel, a lei de regência estabelece que o referido encargo é do possuidor direto do imóvel (no caso, o fiduciante).
(…)
Registre-se, ainda, que o credor fiduciário apenas é considerado proprietário do imóvel para fins de execução da garantia, havendo, inclusive, restrição legal ao seu direito de usar, gozar e dispor da coisa, tanto que a própria lei não o autoriza a ficar com a coisa alienada em garantia se a dívida não for paga no vencimento (art. 27, caput, da Lei nº 9.514/1997). Portanto, sua condição difere, em muito, à do proprietário tradicional por não possuir as mesmas prerrogativas previstas no art. 1.228 do CC/2002.”
Ou seja, parece estar esclarecida a questão. A responsabilidade pelo pagamento das contribuições condominiais do imóvel é do devedor fiduciante. Passa a ser obrigação do credor fiduciário a partir do momento da consolidação da propriedade e assunção da posse direta do imóvel, se isso ocorrer.
A íntegra do acórdão pode ser consultada clicando aqui.
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