STJ reconhece a regularidade da alienação fiduciária de bem de família

03/10/2018

Por Thaís de Souza França

Por Thaís de Souza França

Em decorrência das diversas vantagens quanto à sua constituição, excussão e reduzido risco de perecimento do bem, a alienação fiduciária de bem imóvel, estabelecida pela Lei nº 9.514/1997, é uma espécie de garantia largamente utilizada por factorings e fundos de investimento em direitos creditórios (“FIDCs”).

A constituição de tal garantia em cumprimento às operações também traz benefícios à sociedade contratante, que obtém condições mais benéficas nos negócios realizados, seja em virtude da obtenção de um limite operacional maior, seja em virtude da realização de operações com condições mais vantajosas.

Ocorre que, não raras vezes, após a sociedade contratante muito ter se beneficiado das operações celebradas, quando já iniciado o procedimento de consolidação da propriedade do imóvel pela factoring ou FIDC, o devedor fiduciante (garantidor), quando intimado sobre o início do procedimento de consolidação da propriedade pelo credor fiduciário, adota medidas judiciais visando a declaração de nulidade da alienação fiduciária celebrada, sob o argumento de que o imóvel é bem de família, protegido pela Lei nº 8.009/1990[1].

Em muitos casos, quando constatado que o imóvel oferecido em garantia era bem de família do garantidor, o judiciário declarou a nulidade da alienação fiduciária constituída. Nos últimos anos aumentou o número de casos em que o TJSP adotou o entendimento de que, o garantidor renunciou a tal proteção legal ao celebrar a alienação fiduciária do bem de família, mas ainda não há jurisprudência dominante sobre o tema.  

Felizmente, em recente acórdão proferido, a Terceira Turma do STJ declarou a regularidade da alienação fiduciária de bem de família oferecido em garantia ao cumprimento contrato de fomento mercantil e reconheceu a possibilidade de venda do imóvel a terceiros, tão logo consolidada a propriedade em nome do credor fiduciário.

Acertadamente, a Ministra Nancy Andrighi destacou em seu voto vencedor:
 
“(…) não se pode olvidar da máxima de que a nenhum é dado beneficiar-se de sua própria torpeza, isto é, não pode o devedor ofertar bem em garantia que é sabidamente residência familiar para, posteriormente, vir a informar que tal garantia não encontra respaldo legal, pugnando pela sua exclusão.
A corroborar com tal raciocínio, tem-se também a vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium). Este entendimento conduz à conclusão de que, mesmo sendo impenhorável o bem de família, ainda que indicado à penhora pelo próprio devedor, não há que ser a mesma anulada em caso de ma-fé calcada em comportamentos contraditórios deste.”
 
Tal decisão é um marco para o mercado, pois prestigiou a boa-fé das relações negociais[2], servindo como importante precedente em discussões acerca de garantias em operações celebradas com factorings e FIDCs.
 

 


[1] Lei 8.009/1990, artigo 1º: “O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei”.

[2] Código Civil, artigo 422: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.

 

 

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