Preenchimento posterior de títulos de crédito e efeitos sobre a cessão

26/11/2018

Por Teixeira Fortes Advogados Associados

Por Marcelo Munhoz Marotta

É muito comum, no dia a dia das Factorings e Fundos de Investimentos, a constatação de situações de aquisição de títulos que apresentem algum tipo de vício ou irregularidade, seja com relação a requisitos legais de preenchimento ou com relação à sua origem.
 
A inoponibilidade das exceções aos terceiros de boa-fé é tema recorrente e de extrema importância no mercado de cessão de crédito, uma vez que o cessionário não pode ser responsabilizado ou ter seu direito de receber o crédito adquirido questionado por aquele que cedeu o título, ou ainda com relação aquele que o emitiu.
 
O cheque é um ótimo exemplo de título de crédito que deve atender alguns requisitos formais para sua validade e não são raros os casos de empresas que, ao tentar cobrar o cheque, se deparam com alegações de prescrição, vício formal, entre outros.
 
Em recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, a 3ª Turma entendeu por afastar a ocorrência de prescrição de um cheque, que só teve sua data preenchida mais de quatro anos após a realização da revogação ou contraordem do emitente junto ao Banco emissor.
 
No referido acórdão, a Ministra Nancy Andrighi tece importantes comentários no tocante à necessidade de ser privilegiar a circulação dos títulos de crédito, ressaltando que situações particulares referentes ao momento de emissão do cheque devem ser preteridas em favor da livre e ampla circulação dos títulos de crédito:
 
“[…] o direito deve privilegiar a mais livre e ampla circulação dos títulos de crédito, garantindo a seu portador a segurança de sua aquisição e que o valor nele constante, dentro das regras vigentes, será solvido, independentemente de situações particulares que possam existir no momento em que aquele título foi emitido ou em que ele é apresentado. […] “O interesse social visa, no terreno do crédito, a proporcionar ampla circulação dos títulos de crédito, dando aos terceiros de boa-fé plena garantia e segurança na sua aquisição”.
 
O acórdão ainda faz referência à tese fixada no tema nº 945 dos recursos repetitivos, que diz que a contagem do prazo prescricional tem como marco inicial a data expressamente consignada no espaço reservado para a emissão.
 
A discussão ocorreu, pois, em demanda judicial o emitente do cheque pediu o reconhecimento de sua prescrição, com base na data em que apresentou a revogação ou a contraordem de pagamento ao banco emissor, por entender que referido ato representaria manifestação da vontade do emitente de impedir o saque do título.
 
No entanto, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que, o termo inicial da prescrição do cheque, deve ser a data expressamente consignada no espaço reservado para a emissão da cártula, fazendo referência à Súmula 387 do STF, que preconiza: “A cambial emitida ou aceita com omissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé antes da cobrança ou do protesto”.
 
Importante destacar também, do voto da ministra, que não se pode presumir a existência de má-fé do portador do cheque pelo simples fato do preenchimento da data de emissão ocorrer após eventual contraordem para revogação do cheque.
 
A Lei 7.357/85, em seu artigo 16, demonstra também esse entendimento, vejamos:
 
Art . 16 Se o cheque, incompleto no ato da emissão, for completado com inobservância do convencionado com a emitente, tal fato não pode ser oposto ao portador, a não ser que este tenha adquirido o cheque de má-fé.
 
A relatora destacou, em seu voto, que os riscos da emissão de cheque incompleto recaem sobre seu emitente. Assim, a Terceira Turma deu provimento ao recurso especial para afastar a prescrição e determinar o retorno dos autos ao primeiro grau para análise das demais questões.
 
Referido acórdão é relevante para a área de recuperação de crédito, pois confere mais segurança às Factorings e Fundo de Investimento na aquisição de títulos de crédito no mercado, vez que a decisão do STJ confere livre circulação a estes, garantindo a seu portador a segurança de sua aquisição e que o valor neles descritos, dentro das regras vigentes, deverá ser solvido, independentemente de situações particulares que possam existir no momento em que aquele título foi emitido ou em que ele é apresentado.

Compartilhe

Vistos, etc.

Newsletter do
Teixeira Fortes Advogados

Vistos, etc.

O boletim Vistos, etc. publica os artigos práticos escritos pelos advogados do Teixeira Fortes em suas áreas de atuação. Se desejar recebê-lo, por favor cadastre-se aqui.