Por Gabriel Sales Câmara e Mohamad Fahad Hassam
 

O direito, por vezes, se assenta nas mudanças tecnológicas que pairam ao seu redor e deve sempre estar em busca de novas técnicas de exegese que cumpram o papel de impedir que injustiças se perpetuem. E no caso da recuperação de crédito a medida fundamental se traduz em buscar novas formas de penhora de bens que fujam do convencional, evitando blindagem patrimonial e fraude contra credores.
 

Neste âmbito, o diálogo proposto pelo Dr. Marcelo Augusto de Barros, em seu artigo “Alienação Fiduciário de Tudo”, publicado em 29/11/2017, é claro: “Tudo pode ser alienado em garantia fiduciária. Domínio de internet, marca registrada, uma máquina, obra de arte, participações societárias, cotas de fundos, quaisquer tipos de direitos de crédito, representados por títulos, contratos ou originários de processos judiciais, presentes ou futuros, enfim, tudo.”.

O aumento dos contratos de alienação fiduciária se dá, pois é um eficaz instrumento de garantia que culmina na transferência da propriedade de determinado bem, móvel ou imóvel, para o credor, como forma de assegurar a satisfação de sua obrigação, com cláusula de resolução, na qual o bem retorna à esfera patrimonial do devedor ao final da relação.
 

Logo, se é possível a alienação fiduciária de tudo, também é possível se penhorar os direitos sobre tudo o que for alienado fiduciariamente, pois, para além da penhora de imóveis, automóveis e ativos, a constrição dos direitos do que pode ser alienado fiduciariamente, alcança todo e qualquer bem, já que, como supracitado, tudo pode ser alienado em garantia fiduciária.  

Passado este primeiro apontamento, a doutrina e a jurisprudência se depararam com a impossibilidade da penhora de um bem que não faz parte do patrimônio do devedor, porquanto seja de propriedade do credor fiduciário até o pagamento da dívida.

Neste momento, para acompanhar a evolução do mercado financeiro e aplicar os institutos jurídicos em prol de facilitar a busca pela recuperação de crédito, a atuação diligente exige vanguarda, impulsionando o desenvolvimento de instrumentos capazes de possibilitar a penhora da mais ampla gama de bens e ativos.

Isto quer dizer que a busca por novas alternativas para penhora se mostra essencial no exercício da recuperação de crédito, já que para muito além de imóveis, ativos e veículos, temos que todos os bens são penhoráveis, desde que a Lei não determine o contrário. Barcos, aviões, títulos do tesouro, direitos de alienação fiduciária, absolutamente tudo deve estar no radar, quando se busca o pagamento de uma dívida.

Em resumo: tudo pode ser penhorado, basta ter valor e não ser vedado pela legislação! 

Por conta deste trabalho incessante, cada vez mais se percebe a concretização, por exemplo, da penhora dos direitos do devedor fiduciário em relação ao bem alienado, na medida em que não se exige nem mesmo a anuência do credor fiduciário na operação, como demonstram recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça (REsp nº. 1697645/MG, REsp nº. 1697366/AP, AREsp nº. 1318997/SP, REsp 1.171.341/ DF). A medida, inclusive, se tornou lei com o Código de Processo Civil editado em 2015, já que passou a permitir expressamente esta possibilidade no artigo 835, inciso XII.

E a evolução não para. Em recente decisão proferida em caso patrocinado pelo Teixeira Fortes, além de ser deferido o pedido de penhora dos direitos do devedor em relação o automóvel alienado fiduciariamente, foi deferido o bloqueio da sua transferência, determinando a consolidação futura da penhora em caso de quitação da dívida garantida:

"Caso haja alienação fiduciária, não se mostra possível a penhora do bem, mas sim apenas dos direitos de devedor fiduciante, de que é titular o executado (nesse sentido, STJ, REsp 1.171.341/ DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 6/12/2011), nos termos, aliás, do art. 835, inc. XII, do CPC. A penhora dos direitos em questão impede a transferência da propriedade (TJSP, AI 2133634-05.2016.8.26.0000, Rel. Des. Celso Pimentel, j. 17/8/2016). Portanto, também nessa hipótese de alienação fiduciária, defiro bloqueio de transferência no registro do veículo e considero, apenas por esse ato, aperfeiçoada a constrição judicial. Fica assegurado ao banco credor fiduciário, independentemente de embargos de terceiro, requerer nestes autos, por simples petição, o desbloqueio, em caso de busca e apreensão por inadimplemento das prestações do financiamento garantido pela alienação fiduciária. Quando vier aos autos notícia da quitação de todas as prestações, haverá, em mãos do devedor, consolidação da posse e do domínio do veículo, cabendo então a formalização prevista nos arts. 837 a 839 do CPC, com apreensão e depósito do bem. 4. Expeça-se ofício ao Detran para que forneça informações mais detalhadas acerca do veículo indicado às fls. 310."

 

Com isso, havendo a aplicação dos conceitos e regramentos do direito civil às novas práticas mercadológicas, nota-se uma mudança no panorama da recuperação de crédito em relação à garantia de alienação fiduciária, que deixou de ser um empecilho aos demais credores que não estão garantidos, para se tornar um importante acessório na busca pela penhora de tudo.

 

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