Consumidor: sempre será ressarcido por vícios de qualidade do produto?

25/03/2019

Por Teixeira Fortes Advogados Associados

Por Antônio Carlos Magro Júnior

A Lei n° 8.078/1990, o Código de Defesa do Consumidor (“CDC”), disciplina que o consumidor tem direito a ser ressarcido se o produto por ele adquirido vier a apresentar vícios de qualidade. Mas isto ocorre em qualquer situação, ou seja, deve sempre o fornecedor ser responsabilizado por tais vícios?
 
Conforme disposto no artigo 18, §1º do CDC, pode o consumidor, ao sofrer com os chamados vícios de qualidade do produto, exigir do fornecedor, caso não sejam referidos vícios sanados no prazo de 30 dias, uma das seguintes formas de ressarcimento: ou a substituição do produto, ou a restituição atualizada do que pagou, além de eventuais perdas e danos, ou o abatimento proporcional do preço pago.
 
Assim está disposto na lei consumerista:
 
"Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
 
§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
 
I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
 
II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
 
III – o abatimento proporcional do preço."
 
Importante conceituar que os vícios de produto indicados na norma acima colacionada são as falhas, ocultas ou aparentes, que afetam, via de regra, apenas o próprio produto, tornando-o inadequado ao uso a que se destina por não apresentar a qualidade esperada pelo consumidor, inclusive por deficiência de informação[1].
 
Como exemplos de vícios de qualidade, temos: veículos novos com vazamento de óleo, um ferro elétrico que não esquenta, ou um produto alimentício estragado.
 
Portanto, tomando como exemplo o veículo novo com vazamento de óleo, caso o consumidor entregue o automóvel, para os devidos reparos, na concessionária ou loja que lhe alienou o bem, e em 30 dias uma solução efetiva não lhe for dada, poderá o consumidor escolher uma das três opções acima indicadas de ressarcimento, e inclusive poderá propor medida judicial que obrigue o fornecedor a adimplir com a obrigação que vier a optar.
 
Destaque-se que para certas situações o consumidor sequer está obrigado a aguardar o prazo de 30 dias concedidos ao fornecedor, sempre que, em razão da extensão dos vícios, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade, características do produto, e valor econômico do bem, ou quando o produto for considerado essencial, como um veículo utilizado como taxi, ou mesmo uma geladeira (18, §3º, do CDC).
 
Mas há casos em que o consumidor não poderá se beneficiar da regra ora em análise, sendo os principais os seguintes: quando houver a chamada culpa exclusiva ou concorrente do consumidor, a existência de fato exclusivo de terceiro, ou por motivo de caso fortuito ou de força maior.
 
A culpa exclusiva está prevista no artigo 12, §3°, III, do CDC, e se verifica na hipótese do consumidor que, consciente do vício no produto, insiste em sua utilização, de sorte a assumir o total risco de sofrer danos[2]; este fato pode vir a afastar a responsabilidade do fornecedor, se devidamente comprovado.
 
Já a culpa concorrente, conforme disciplina o artigo 945 do Código Civil, temos no caso em que o consumidor contribui com sua culpa para a produção do dano; em situações que tais, dever-se-á verificar em que extensão o consumidor concorreu para indicado dano, e, desta feita, poderemos ter uma atenuação da responsabilidade do fornecedor[3]. A culpa concorrente do consumidor, importante destacar, não é assunto pacificado entre os doutrinadores, pois há quem entenda que, por não ter sido expressamente prevista pelo legislador quando da edição do CDC, não poderia tal conceito ser emprestado da legislação civil.
 
Prosseguindo, sobre o fato exclusivo de terceiro, igualmente previsto no CDC como excludente de responsabilidade do fornecedor (artigo 12, §3°, III), ocorre quando um terceiro à relação de consumo e que não a integra, estranho, portanto, ao vínculo existente entre o fornecedor e o consumidor[4], pratica o ato que resulta no dano ao produto. Não há que se falar, em casos assim, no ressarcimento ao consumidor pelo fornecedor.
 
Por fim, a respeito do caso fortuito ou de força maior, sendo eles aqueles fatos alheios à vontade da parte, que impedem o cumprimento de algum dever ou obrigação, da mesma forma que a culpa concorrente não foi objeto de expressa previsão no CDC, e há divergência a respeito do tema entre os doutrinadores, no sentido de poder o fornecedor se valer de referida excludente de responsabilidade. Embora grande parte da doutrina entenda que o risco do fornecedor é integral, justamente por não haver a lei previsto a excludente em apreço[5], dadas as circunstâncias do caso concreto, pode o fornecedor buscar judicialmente seja desobrigado a arcar com indenização em favor do consumidor.
 
Como se vê, inexistindo acordo, várias são as hipóteses em que as partes poderão divergir quanto ao efetivo direito do consumidor de ser ressarcido por vícios de qualidade do produto. Tais situações demandam principalmente prova, que geralmente ficará a cargo do fornecedor, em razão da inversão do ônus probatório decorrente da relação de consumo (artigo 6º, VIII, do CDC).
 
É certo que caberá ao Judiciário, portanto, aplicar a melhor solução a cada caso levado a seu conhecimento.

 


[1]Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor, Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, 3ª Edição, Editora Saraiva, São Paulo, 2010, p. 164.

[2] Sanseverino, op. cit, p. 293.

[3] Sanseverino, op. cit, p. 301/302.

[4] Programa de Direito do Consumidor, Sergio Cavalieri Filho, 2ª Edição, Editora Atlas, São Paulo, 2010, p. 281.

[5] Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Luiz Antônio Rizzato Nunes, Editora Saraiva, São Paulo, 2000. p. 169.

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