Por Vinicius de Barros
As empresas que importam mercadorias não devem pagar os valores cobrados pela Receita Federal pela Taxa Siscomex, devida no registro de declaração de importação. O juiz da 4ª Vara Federal de Santos concordou com nossa tese e autorizou que uma empresa por nós representada recolhesse a Taxa do Siscomex sem o aumento de quase 500% provocado pela Portaria n. 257, de 2011, do Ministério da Fazenda. Caso se confirme a decisão, a empresa fará jus à devolução dos valores pagos a maior nos últimos 5 anos.
A taxa Siscomex foi instituída pelo artigo 3º da Lei n. 9.716 de 1998, que em seu parágrafo 1º estabeleceu os valores devidos:
“Art. 3º Fica instituída a Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior – SISCOMEX, administrada pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.
§ 1º A taxa a que se refere este artigo será devida no Registro da Declaração de Importação, à razão de:
I – R$ 30,00 (trinta reais) por Declaração de Importação;
II – R$ 10,00 (dez reais) para cada adição de mercadorias à Declaração de Importação, observado limite fixado pela Secretaria da Receita Federal.”
O parágrafo 2º, por sua vez, definiu que os valores previstos no parágrafo 1º da lei poderiam ser “reajustados, anualmente, mediante ato do Ministro de Estado da Fazenda, conforme a variação dos custos de operação e dos investimentos no SISCOMEX.”
O então Ministro da Fazenda, Sr. Guido Mantega, aumentou em mais de 500% o valor da Taxa Siscomex, conforme Portaria MF n. 257, de 20 de maio de 2011:
“O MINISTRO DA FAZENDA, no uso das atribuições que lhe conferem o artigo 87, parágrafo único, incisos I e II, da Constituição Federal, considerando o disposto no artigo 6º, do Decreto-Lei nº 1.437, de 17 de dezembro de 1975, ratificado pelo Decreto Legislativo nº 22, de 27 de agosto de 1990, e no parágrafo 2º do artigo 3º da Lei nº 9.716, de 26 de novembro de 1998, resolve:
Art. 1º Reajustar a Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX), devida no Registro da Declaração de Importação (DI), de que trata o parágrafo 1º do artigo 3º da Lei nº 9.716, de 1998, nos seguintes valores:
I – R$ 185,00 (cento e oitenta e cinco reais) por DI;
II – R$ 29,50 (vinte e nove reais e cinquenta centavos) para cada adição de mercadorias à DI, observados os limites fixados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB).
Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.”
Ocorre que o referido aumento foi julgado inconstitucional pelo Excelso Supremo Tribunal Federal, conforme precedentes abaixo:
“SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO TRIBUTÁRIO. TAXA DE UTILIZAÇÃO DO SISTEMA INTEGRADO DE COMERCIO EXTERIOR – SISCOMEX. MAJORAÇÃO. PORTARIA MF 257/2011. 1. É inconstitucional a majoração da taxa SISCOMEX promovida pela Portaria MF 257/2011. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (ARE 1089538)
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – TAXA SISCOMEX – MAJORAÇÃO MEDIANTE PORTARIA DO PODER EXECUTIVO – INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA – CONTROVÉRSIA JURÍDICA DIRIMIDA POR AMBAS AS TURMAS DO STF – SUCUMBÊNCIA RECURSAL (CPC, ART. 85, § 11) – MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA – PRECEDENTE (PLENO) – NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DOS LIMITES ESTABELECIDOS NO ART. 85, §§ 2º E 3º DO CPC – AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.” (RE 1149356 )
O Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região vem acompanhando o entendimento do STF, conforme se infere por uma de suas mais recentes decisões:
“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. TAXA SISCOMEX. REAJUSTE DE VALORES.POR ATO INFRALEGAL.PORTARIA MF Nº 257, DE 2011. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO UF IMPROVIDAS.
– A Lei nº 9.716/98, no seu artigo 3º, § 2º, permite ao Ministro da Fazenda estabelecer reajustes da taxa, mas não fixa balizas mínimas e máximas para uma eventual delegação tributária. Por esta razão, a majoração de alíquotas trazida pela Portaria nº 257/2011 afronta o princípio da legalidade.
– Jurisprudência de ambas as turmas do C. STF no sentido da inconstitucionalidade da majoração da taxa SISCOMEX pela Portaria do Poder Executivo.
-A impetrante comprovou a condição de contribuinte, ficando autorizada, administrativamente, a apresentar outros documentos que sejam considerados necessários e/ou imprescindíveis, ficando a cargo da autoridade administrativa a fiscalização acerca da existência ou não de créditos a serem restituídos e a exatidão dos números.
-A compensação dos valores pagos indevidamente, corrigidos pela taxa SELIC, pode ser realizada com quaisquer tributos administrados pela Receita Federal do Brasil, conforme o art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, com a redação da Lei nº 10.637, de 2002, observando-se ainda o disposto no art. 170-A do CTN.
-Remessa oficial e Apelação UF improvidas.” (APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO – 5006570-38.2018.4.03.6119)
Como se vê pelas decisões acima, a jurisprudência considerou o aumento da Taxa Siscomex inconstitucional porque, apesar de a lei que instituiu o tributo tenha permitido o reajuste dos valores pelo Poder Executivo, o Legislativo não fixou balizas mínimas e máximas para uma eventual delegação tributária, o que fez com que o aumento pela Portaria MF n. 257/2011 afrontasse o princípio da legalidade.
A reforçar a inconstitucionalidade da majoração da Taxa Siscomex, podemos acrescentar os seguintes fundamentos:
a) Conforme previsto no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, somente lei em sentido estrito é instrumento hábil para a majoração de tributos, o que impede o aumento da Taxa Siscomex por simples portaria;
b) A tentativa de delegar o poder de majorar a Taxa Siscomex para o Ministro da Fazenda viola os princípios da separação dos poderes e da indelegabilidade; a Constituição Federal atribuiu exclusivamente ao Poder Legislativo a competência de criar e majorar tributo, razão pela qual esta não pode ser exercida pelo Poder Executivo;
c) A Portaria MF 257/2011, ao reajustar os valores inicialmente fixados pela lei de regência, não demonstrou a variação dos custos de operação e dos investimentos no Siscomex no período, de modo a cumprir a determinação contida no artigo 3º, parágrafo 2º, da Lei n. 9.716/1998;
d) a Secretaria da Receita Federal apresentou notas técnicas demonstrando que o aumento da arrecadação da Taxa Siscomex seria utilizado para a modernização de todo parque de informática do órgão, deixando claro o desvio de finalidade no aumento da referida taxa, fato que também retira a legitimidade da nova cobrança majorada.
Qualquer empresa que realize importação e seja contribuinte da Taxa Siscomex pode pleitear na justiça o direito de não recolher os valores majorados e de reaver os pagamentos feitos indevidamente.
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