Justiça proíbe Receita Federal de cobrar taxa de importação

16/08/2019

Por Vinícius de Barros

Por Vinicius de Barros

As empresas que importam mercadorias não devem pagar os valores cobrados pela Receita Federal pela Taxa Siscomex, devida no registro de declaração de importação. O juiz da 4ª Vara Federal de Santos concordou com nossa tese e autorizou que uma empresa por nós representada recolhesse a Taxa do Siscomex sem o aumento de quase 500% provocado pela Portaria n. 257, de 2011, do Ministério da Fazenda. Caso se confirme a decisão, a empresa fará jus à devolução dos valores pagos a maior nos últimos 5 anos.

 

A taxa Siscomex foi instituída pelo artigo 3º da Lei n. 9.716 de 1998, que em seu parágrafo 1º estabeleceu os valores devidos:
 

“Art. 3º Fica instituída a Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior – SISCOMEX, administrada pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.
 

§ 1º A taxa a que se refere este artigo será devida no Registro da Declaração de Importação, à razão de:
 

I – R$ 30,00 (trinta reais) por Declaração de Importação;
 

II – R$ 10,00 (dez reais) para cada adição de mercadorias à Declaração de Importação, observado limite fixado pela Secretaria da Receita Federal.”
 

O parágrafo 2º, por sua vez, definiu que os valores previstos no parágrafo 1º da lei poderiam ser “reajustados, anualmente, mediante ato do Ministro de Estado da Fazenda, conforme a variação dos custos de operação e dos investimentos no SISCOMEX.”
 

O então Ministro da Fazenda, Sr. Guido Mantega, aumentou em mais de 500% o valor da Taxa Siscomex, conforme Portaria MF n. 257, de 20 de maio de 2011:
 

“O MINISTRO DA FAZENDA, no uso das atribuições que lhe conferem o artigo 87, parágrafo único, incisos I e II, da Constituição Federal, considerando o disposto no artigo 6º, do Decreto-Lei nº 1.437, de 17 de dezembro de 1975, ratificado pelo Decreto Legislativo nº 22, de 27 de agosto de 1990, e no parágrafo 2º do artigo 3º da Lei nº 9.716, de 26 de novembro de 1998, resolve:
 

Art. 1º Reajustar a Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX), devida no Registro da Declaração de Importação (DI), de que trata o parágrafo 1º do artigo 3º da Lei nº 9.716, de 1998, nos seguintes valores:
 

I – R$ 185,00 (cento e oitenta e cinco reais) por DI;
 

II – R$ 29,50 (vinte e nove reais e cinquenta centavos) para cada adição de mercadorias à DI, observados os limites fixados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB).
 

Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.”
 

Ocorre que o referido aumento foi julgado inconstitucional pelo Excelso Supremo Tribunal Federal, conforme precedentes abaixo:
 

“SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO TRIBUTÁRIO. TAXA DE UTILIZAÇÃO DO SISTEMA INTEGRADO DE COMERCIO EXTERIOR – SISCOMEX. MAJORAÇÃO. PORTARIA MF 257/2011. 1. É inconstitucional a majoração da taxa SISCOMEX promovida pela Portaria MF 257/2011. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (ARE 1089538)
 

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – TAXA SISCOMEX – MAJORAÇÃO MEDIANTE PORTARIA DO PODER EXECUTIVO – INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA – CONTROVÉRSIA JURÍDICA DIRIMIDA POR AMBAS AS TURMAS DO STF – SUCUMBÊNCIA RECURSAL (CPC, ART. 85, § 11) – MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA – PRECEDENTE (PLENO) – NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DOS LIMITES ESTABELECIDOS NO ART. 85, §§ 2º E 3º DO CPC – AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.” (RE 1149356 )

O Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região vem acompanhando o entendimento do STF, conforme se infere por uma de suas mais recentes decisões:
 

“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. TAXA SISCOMEX. REAJUSTE DE VALORES.POR ATO INFRALEGAL.PORTARIA MF Nº 257, DE 2011. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO UF IMPROVIDAS.
 

– A Lei nº 9.716/98, no seu artigo 3º, § 2º, permite ao Ministro da Fazenda estabelecer reajustes da taxa, mas não fixa balizas mínimas e máximas para uma eventual delegação tributária. Por esta razão, a majoração de alíquotas trazida pela Portaria nº 257/2011 afronta o princípio da legalidade.
 

– Jurisprudência de ambas as turmas do C. STF no sentido da inconstitucionalidade da majoração da taxa SISCOMEX pela Portaria do Poder Executivo.
 

-A impetrante comprovou a condição de contribuinte, ficando autorizada, administrativamente, a apresentar outros documentos que sejam considerados necessários e/ou imprescindíveis, ficando a cargo da autoridade administrativa a fiscalização acerca da existência ou não de créditos a serem restituídos e a exatidão dos números.
 

-A compensação dos valores pagos indevidamente, corrigidos pela taxa SELIC, pode ser realizada com quaisquer tributos administrados pela Receita Federal do Brasil, conforme o art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, com a redação da Lei nº 10.637, de 2002, observando-se ainda o disposto no art. 170-A do CTN.
 

-Remessa oficial e Apelação UF improvidas.” (APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO – 5006570-38.2018.4.03.6119)
 

Como se vê pelas decisões acima, a jurisprudência considerou o aumento da Taxa Siscomex inconstitucional porque, apesar de a lei que instituiu o tributo tenha permitido o reajuste dos valores pelo Poder Executivo, o Legislativo não fixou balizas mínimas e máximas para uma eventual delegação tributária, o que fez com que o aumento pela Portaria MF n. 257/2011 afrontasse o princípio da legalidade.
 

A reforçar a inconstitucionalidade da majoração da Taxa Siscomex, podemos acrescentar os seguintes fundamentos:
 

a) Conforme previsto no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, somente lei em sentido estrito é instrumento hábil para a majoração de tributos, o que impede o aumento da Taxa Siscomex por simples portaria;
 

b) A tentativa de delegar o poder de majorar a Taxa Siscomex para o Ministro da Fazenda viola os princípios da separação dos poderes e da indelegabilidade; a Constituição Federal atribuiu exclusivamente ao Poder Legislativo a competência de criar e majorar tributo, razão pela qual esta não pode ser exercida pelo Poder Executivo;
 

c) A Portaria MF 257/2011, ao reajustar os valores inicialmente fixados pela lei de regência, não demonstrou a variação dos custos de operação e dos investimentos no Siscomex no período, de modo a cumprir a determinação contida no artigo 3º, parágrafo 2º, da Lei n. 9.716/1998; 
 

d) a Secretaria da Receita Federal apresentou notas técnicas demonstrando que o aumento da arrecadação da Taxa Siscomex seria utilizado para a modernização de todo parque de informática do órgão, deixando claro o desvio de finalidade no aumento da referida taxa, fato que também retira a legitimidade da nova cobrança majorada.
 

Qualquer empresa que realize importação e seja contribuinte da Taxa Siscomex pode pleitear na justiça o direito de não recolher os valores majorados e de reaver os pagamentos feitos indevidamente. 

 

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