Stay period só pode ser prorrogado em caráter excepcional, decide o TJSP

02/09/2019

Por Roberto Caldeira Brant Tomaz

por Roberto Caldeira Brant Tomaz

A Lei de Falências e Recuperação Judicial prevê em seu artigo 6º, §4º[1], que a partir do deferimento do processamento da recuperação judicial todas as ações e execuções em face do devedor deverão ser suspensas por um prazo improrrogável de até 180 dias.
 
Uma das finalidades dessa disposição legal seria a de possibilitar que a empresa continuasse a exercer as suas atividades com um certo fôlego em relação às cobranças de credores, em especial relacionadas à busca e apreensão de bens e direitos concedidos em garantia fiduciária.
 
Embora o referido artigo disponha que o prazo de suspensão – também chamado de stay period – “em hipótese alguma” poderá exceder 180 dias, o que se verifica na prática é que raramente uma recuperação judicial tramita hoje sem a prorrogação desse prazo. A prorrogação do que deveria ser inadiável em nenhuma circunstância incrivelmente se tornou a regra.
 
Diante dos recorrentes abusos em relação ao stay period, a Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo publicou no dia 22/08/2019 um enunciado que busca uniformizar o entendimento nos julgamentos das duas Câmaras Empresariais do TJ-SP. De acordo com o Enunciado 9:
 
“A flexibilização do prazo do stay period pode ser admitida, em caráter excepcional, desde que a recuperanda não haja concorrido com a superação do lapso temporal e a dilação se faça por prazo determinado.”
 
Claramente, o Judiciário percebeu que muitos devedores vêm se valendo do famigerado princípio da preservação da empresa para conseguir postergar a apresentação de um plano de soerguimento viável, lançando mão de toda sorte de manobras processuais para atrasar o cumprimento de suas obrigações perante os credores.
 
A nosso ver, o entendimento exposto no referido Enunciado 9 não chega a se alinhar totalmente com a norma legal (art. 6º), que é clara e objetiva ao proibir que o prazo de suspensão ultrapasse 180 dias, mas pode ser considerado um avanço para se refrear os diversos artifícios utilizados pelos devedores, não coibidos pelos magistrados, e tentar restabelecer o sentido empregado pelo legislador ao texto da lei.
 
Hoje já é possível observar que o Judiciário tem se atentando às sérias consequências do uso indevido do princípio da preservação da empresa, passando a se pronunciar sobre temas relevantes como o aqui abordado.
 
Um outro exemplo é a recente decisão do STJ, no julgamento do REsp 1.698.283, definindo que o mesmo prazo de suspensão aqui discutido, stay period, deve ser sempre contado em dias corridos, e não em dias úteis, o que também pode ser considerado um progresso, que impedirá que o devedor se beneficie ainda mais do tempo para se manter inadimplente frente a seus credores.
 
Chegamos no pico da relativização que o princípio da preservação da empresa poderia permitir, sendo necessário uma mobilização dessa natureza no meio jurídico em defesa da legalidade e da segurança jurídica.

 


[1] Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
§ 4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial.

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