Receita Federal erra ao falar sobre denúncia espontânea

10/09/2019

Por Teixeira Fortes Advogados Associados

Por Pedro Monteiro
 

No final do mês passado, a Receita Federal do Brasil divulgou a Solução de Consulta nº 233/2019, por meio da qual respondeu aos questionamentos de um contribuinte sobre o instituto da denúncia espontânea, previsto no artigo 138 do Código Tributário Nacional (“CTN”), que nada mais é do que a possibilidade do contribuinte confessar a existência de um débito tributário antes da instauração de qualquer procedimento de fiscalização, tendo como “recompensa” a dispensa da aplicação da multa pelo pagamento em atraso.

 

Nessa consulta, o contribuinte fez as seguintes indagações à Receita Federal:

 

a) Qual seria a forma correta para operacionalizar/instrumentalizar a denúncia espontânea?

 

b) Quais tipos de multas são afastadas pela denúncia espontânea?

 

c) É possível considerar a compensação como uma espécie de pagamento para se valer dos benefícios da denúncia espontânea?

 

O primeiro ponto abordado diz respeito à forma como o contribuinte deve fazer a denúncia espontânea (item “a”). De acordo com a interpretação da Receita Federal sobre o art. 138 do CTN, os requisitos para instrumentalização da denúncia espontânea são: (i) “pagamento do tributo devido e dos juros de mora” e (ii) “comunicação do infrator à autoridade antes de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração”.

 

Na prática, a autodenúncia do contribuinte só se configura por meio da entrega das declarações exigidas pela Receita Federal para a confissão de débitos. Esse questionamento surgiu pois o contribuinte que formulou a consulta cogitou se haveria outro modo de instrumentalizar a denúncia espontânea, como a apresentação de requerimento administrativo, hipótese que foi rechaçada pela solução de consulta.

 

Em relação ao questionamento do item “b”, a Receita Federal se curvou ao entendimento dos Tribunais para reconhecer que, ao proceder à denúncia espontânea, o contribuinte pode realizar o pagamento do débito sem a incidência da “multa de mora”.

 

Por outro lado, a resposta à solução deixou claro que a “multa punitiva”, aplicada pelo descumprimento de obrigação acessória (por exemplo, pela não entrega ou entrega atrasada de uma declaração), não seria afastada pela denúncia espontânea. Em relação a esse ponto, apesar desse entendimento restritivo por parte da Receita Federal encontrar respaldo em alguns precedentes do Poder Judiciário, ainda assim existem bons argumentos para afastar essa posição. Citamos, como exemplo, o fato de a redação do artigo 138 do CTN não especificar qual tipo de “responsabilidade” é afastada pela denúncia espontânea, o que permite concluir que tanto a multa punitiva quanto a moratória são abonadas, inclusive porque não haveria diferença entre as duas, conforme a jurisprudência do STF (RE 79.625/SP).

 

Por fim, no que diz respeito ao questionamento representado no item “c” acima, apesar da solução de consulta em análise ter se posicionado sobre a impossibilidade de equiparar a compensação ao pagamento efetivo do tributo para fins da denúncia espontânea, discordamos do entendimento do fisco.

 

Isso porque, ao contrário do equivocado e restrito ponto de vista do fisco de que o benefício da denúncia espontânea só seria aplicável se o pagamento do tributo fosse feito em dinheiro, a interpretação da legislação tributária nos leva a concluir de forma diferente, no sentido de que é possível usufruir dos benefícios da denúncia espontânea na hipótese de o pagamento ser feito por meio de compensação:

 

i. o art. 156 do CTN estabelece que o pagamento e a compensação são, igualmente, causas extintivas do crédito tributário; há vários exemplos de dispositivos legais que dão à compensação a finalidade de pagamento (art. 7º do Decreto-lei nº 2.287/1986 e o art. 74, § 2º, da Lei nº 9.430/1996) e a jurisprudência corrobora esse entendimento ((REsp nº 1.122.131/SC e REsp nº 1.136.372/RS);

 

ii. o fato de a compensação se sujeitar a homologação posterior pelo fisco não permite deixar de equiparar as duas modalidades (pagamento e compensação), inclusive porque até mesmo o pagamento em dinheiro de tributos sujeitos a lançamento por homologação está sujeito à validação posterior pela Receita Federal.

 

Como se vê, a denúncia espontânea continua sendo alvo de muitos questionamentos, com diferentes posicionamentos, o que gera insegurança aos contribuintes sobre quais os procedimentos corretos que devem ser adotados para usufruir dos benefícios do art. art. 138 do CTN e, mais do que isso, sobre quais de fato são os benefícios da denúncia espontânea.

 

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