Por Mohamad Fahad Hassan
Introduzida pela Lei 11.382/2016, no artigo 615-A do antigo Código de Processo Civil, a averbação premonitória consiste em ferramenta que passou a permitir ao credor, independentemente de ordem judicial, anotar a existência da ação contra o devedor no registro do patrimônio deste (como por exemplo veículos, perante o Detran; imóveis, perante os Cartórios de Imóveis), impedindo assim que ele cometa atos de disposição ou oneração que inviabilizem a posterior penhora dos bens. Em outras palavras: é medida que previne o credor contra o cometimento de fraude à execução.
O artigo 615-A do antigo Código de Processo de Civil foi reproduzido pelo artigo 828 do diploma em vigor:
"Art. 828. O exequente poderá obter certidão de que a execução foi admitida pelo juiz, com identificação das partes e do valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, de veículos ou de outros bens sujeitos a penhora, arresto ou indisponibilidade."
Como se vê, tanto na antiga quanto na nova Lei, a providência dispensa qualquer ato formal do juiz do processo, exigindo apenas que o credor obtenha, no ato do ajuizamento da ação, uma certidão correspondente, o que naturalmente trouxe um profícuo avanço no procedimento de execução, que propiciou e continua propiciando positivos resultados na área de recuperação de crédito.
Apesar de importantíssima ferramenta, a providência não dispensa que o credor cuide de requerer a penhora do bem (paralela ou simultaneamente à providência da averbação premonitória). Isso porque a Lei Processual estabelece em seu artigo 797 que é somente pela penhora que o credor adquire a preferência sobre o bem do devedor. Com efeito:
"Art. 797. Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal, realiza-se a execução no interesse do exequente que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens penhorados.
Parágrafo único. Recaindo mais de uma penhora sobre o mesmo bem, cada exequente conservará o seu título de preferência."
Seguindo a previsão legal, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento ocorrido em 19/09/2019, decidiu a controvérsia envolvendo dois credores. O caso envolvia processo em que determinado credor reivindicava a adjudicação sobre bem imóvel do devedor, penhorado em seu processo de execução, que o juiz se negava conceder, sob o argumento de que, antes da penhora, outro credor havia averbado a existência de sua ação na matrícula do imóvel.
Em julgamento do Recurso Especial 1.334.635, o STJ decidiu que a averbação premonitória protege o credor da intenção do devedor de se desfazer de seus bens, mas não impede a expropriação forçada do bem em favor de outro credor, tampouco confere preferência ao credor que fez a prenotação.
Em voto da lavra do Ministro Antonio Carlos Ferreira, a Corte assentou que:
"Com efeito, a averbação premonitória – introduzida no CPC/1973 pela Lei Federal n. 11.382/2016 – tem inequívoca finalidade de proteger o credor contra a prática de fraude à execução, afastando a presunção de boa-fé de terceiros que porventura venham a adquirir bens do devedor…
Portanto, uma vez anotada à margem do registro do bem a existência do processo executivo, o credor que a providenciou obtém em seu favor a presunção absoluta de que eventual alienação futura dar-se-á em fraude à execução (CPC/1973, art. 615-A, 3o) e, desse modo, será ineficaz em relação à execução por ele ajuizada.
…
Desse modo, sendo certo que a averbação premonitória não se equipara à penhora, força concluir que aquela não induz preferência do credor em prejuízo desta. Em suma, a preferência será do credor que primeiro promover a penhora judicial."
Além de definir a figura jurídica da chamada averbação premonitória – diferenciando-a de uma efetiva constrição – a decisão é tanto mais relevante porque afasta uma equivocada premissa que muitos juízes têm aplicado para indeferir a penhora e arresto liminar ou acautelatório de bens do devedor, especialmente no início do processo, sob o fundamento de que o credor dispõe da providência [da averbação premonitória] para garantir a satisfação de seu crédito, e que isso supostamente dispensaria a preocupação com a penhora.
Pela recente decisão do STJ, ficou bastante claro que a providência garante proteção contra a fraude na dilapidação do patrimônio, mas não impede a perda do direito diante de outras penhoras que o mesmo bem possa sofrer.
Ao credor diligente, portanto, fica o alerta de que é imprescindível justificar o pedido de penhora e/ou arresto, de caráter liminar ou acautelatório, no fato de que a providência extraprocessual não supre a necessária penhora do bem para garantir sua preferência sobre o patrimônio do devedor, em especial nos casos em que se tem conhecimento de outros processos executivos movidos contra o mesmo devedor.
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