Grupos do setor imobiliário começam a subir a bordo do crowdfunding

11/11/2019

Por Marsella Medeiros Bernardes

por Marsella Medeiros Araújo Bernardes e Marcelo Augusto de Barros

Em 2016, o blog da Prodigy Network, uma das maiores plataformas de crowdfunding imobiliário dos Estados Unidos, destacava 8 frases que ressaltavam os benefícios desse modelo de financiamento coletivo, uma delas bem ilustrativa do futuro que viria a se consolidar:

“Crowdfunding está criando um novo mercado público que conecta as pessoas comuns com oportunidades de investimento que antes eram acessíveis somente aos grandes investidores.”

Desde então, esse setor não parou de crescer. Somente em 2019, os investidores devem aportar USD 2,5 bilhões no mercado imobiliário norte americano via plataformas on-line, estima o site Investopedia.

Para se ter uma ideia de como funciona nos Estados Unidos, nesse exato momento a Prodigy Network anuncia a oportunidade de investimento destinada à aquisição, construção e operação de um edifício de apartamentos de 7 andares, com 254 unidades que serão destinadas à locação, em Chicago (Old Town Residences). O empreendedor busca arrecadar cerca de USD 45 milhões de uma obra total estimada em cem milhões de dólares. O projeto estima um horizonte de investimento entre 4 e 6 anos, com uma taxa de rentabilidade anual estimada entre 10% e 16%, distribuição anual e preferencial de lucros de 7%, e estratégia de saída consistente na venda ou refinanciamento da propriedade.

A Fundrise é outra grande plataforma americana de crowdfunding imobiliário, aberta a qualquer investidor, sem restrições de credenciamento ou patrimônio, com ofertas diversificadas de investimento a partir de USD 500. Proporciona retornos basicamente de duas maneiras: (a) por meio de dividendos trimestrais e (b) por valorização do investimento. O horizonte do tempo de investimento também costuma ser de muito longo prazo, próximo de 5 anos.

No Brasil, o movimento de financiamento coletivo imobiliário já tem dado os primeiros passos para levantar voo.

Por enquanto esse movimento é restrito a projetos no valor máximo de R$ 5 milhões, captados por empresas imobiliárias com receita anual de até R$ 10 milhões.

Mas já é o bastante para o surgimento de novas fintechs de investimento e do crescente interesse de empreendedores e investidores.

O crowdfunding de investimento foi regularizado no Brasil a partir da Instrução CVM nº 588, de 13 de julho de 2017, quando a Comissão de Valores Mobiliários autorizou a oferta pública de distribuição de valores mobiliários realizada com a dispensa de registro. As ofertas previstas nessa norma devem ser realizadas por meio de plataforma de investimento on-line devidamente registrada na CVM. A lista atualizada com todas as plataformas autorizadas está disponível para consulta no site da referida entidade.

As plataformas oferecem diversos tipos de investimentos, a maioria em startup (equity crowdfunding). Algumas já são dedicadas exclusivamente a projetos imobiliários. E, em breve, com a criação da CIR, esse mercado deverá se expandir para o agronegócio.

Em resumo, as empresas imobiliárias utilizam a internet para captar recursos dos investidores e emitem em troca contratos ou títulos que conferem a eles o direito de crédito ou de participação no negócio.

Nem todo empreendedor imobiliário pode captar recursos por meio de financiamento coletivo na internet com dispensa automática de registro na CVM. Essa modalidade de captação pública é permitida, nos termos do art. 2º, inciso III da Instrução CVM n° 588, apenas para as (i) sociedades empresárias consideradas de pequeno porte pela CVM, isto é, com receita bruta anual de até R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), (ii) e que não estejam registradas como emissoras de valores mobiliários.

Alerta: na hipótese de a ofertante ser controlada por outra pessoa jurídica ou por fundo de investimento, a receita bruta consolidada anual conjunta das entidades que estejam sob controle comum não pode exceder ao limite de R$ 10 milhões (art. 2º, § 3º).

Qualquer investidor pode participar. Existem, no entanto, limites de aplicação que dependem do perfil do interessado. Como regra, podem ser aplicados até R$ 10.000,00 (dez mil reais) em plataformas de crowdfunding por ano-calendário. Se a renda bruta anual do investidor ou o montante de investimentos financeiros for superior a R$ 100.000,00 (cem mil reais), o limite anual de investimento poderá ser ampliado para até 10% (dez por cento) do maior desses dois valores por ano-calendário. Esses limites não se aplicam a investidores qualificados, isto é, que possuem aplicações financeiras em valor superior a R$ 1.000.000,00.

Já são diversas plataformas de crowdfunding de investimento imobiliário existentes e atuantes no mercado brasileiro, como a Urbe.Me, INCO, Glebba, Bloxs e NaPlanta.

As ofertas realizadas no Brasil ainda são limitadas ao modelo de investimento em dívida, ou seja, com retorno previsto em remuneração calculada em percentual do valor geral de vendas (VGV), geralmente com um mínimo assegurado.

Por exemplo, na última captação intermediada pela INCO, no valor de R$ 900.000,00, o valor mobiliário ofertado na plataforma baseou-se em um contrato de mútuo com a expectativa de rentabilidade anual de 13 a 14%, a depender da quantidade de unidades vendidas, retorno em 18 meses, e com garantias real e pessoal.

A Urbe.Me acaba de abrir uma captação no valor total e R$ 1.000.000,00, estruturada a partir de endosso de CCB ao investidor com a rentabilidade (a) mínima anual fixada em 120% do CDI e (b) projetada (TIR) de entre 15,06% e 19,16% a.a. O título vence em 24 meses.

A plataforma Glebba foi autorizada de acordo com o Ato Declaratório 16.162, de 6 de março de 2018, e tem um histórico de R$ 3 milhões captados perante 110 investidores em quatro ofertas concluídas.

Atualmente, a Bloxs disponibiliza uma oferta de valor mobiliário consistente em dívida (contrato de investimento), com captação de R$ 400.000,00 a R$ 600.000,00, rentabilidade variável entre 0,90% a 1,10% ao mês, investimento mínimo de R$ 5.000,00 e quitação em janeiro de 2021.

No blog da NaPlanta a plataforma destaca "as 5 principais vantagens do crowdfunding imobiliário em relação a outros investimentos", destacando o fácil acesso, o investimento com valores baixos (a partir de R$ 1.000,00), a diversificação de localização, a relativa segurança gerada pelo selo de aprovação da CVM e a alta rentabilidade em relação a outros investimentos disponíveis às pessoas comuns.

Ainda que haja a expectativa de retorno financeiro no investimento feito por meio de crowdfunding nos percentuais indicados pelas plataformas, é preciso estar atento: a rentabilidade é variável e sempre depende do pagamento da dívida pela empresa captadora.

Essas captações, em geral, têm se referido a empreendimentos imobiliários já lançados e com lotes ou apartamentos remanescentes para venda. O recurso captado é utilizado na conclusão da obra, na ampliação da equipe de vendas, na propaganda do empreendimento, enfim, dentre outros itens capazes de contribuir para a conclusão da obra ou a venda dos imóveis.

Nada impede, no entanto, que um empreendedor enxergue uma oportunidade de construção de casas na praia para locação e futura venda, ou de galpões comerciais com o mesmo objetivo, proporcionando ao investidor o recebimento de dividendos durante o período de aluguel e um retorno com a estratégia de saída a longo prazo (venda).

Embora ainda existam as limitações de captação (R$ 5 milhões) e de ofertantes (receita brutal de R$ 10 milhões), as captações via plataformas de crowdfunding de investimento imobiliário estão chamando a atenção de potenciais participantes, tanto dos interessados em captar, quanto dos investidores, e principalmente de empresários do setor imobiliário que já buscam criar a sua própria plataforma. A experiência norte americana não pode ser desprezada.

Os contratos de investimentos são assinados eletronicamente, geralmente nos padrões utilizados por Clicksign ou Docusign, que dispensam o certificado ICP-Brasil. Seguindo o padrão utilizado em operações celebradas com fintechs de crédito (tomador) e de peer-to-peer lending (tomador ou investidor).

Recomendamos a leitura do Material Didático disponibilizado nos sites das plataformas de financiamento coletivo on-line, assim como o Caderno 12 da CVM, editado recentemente, que trata do crowdfunding de investimento em geral.

E, por fim, sugerimos especial atenção aos investidores às informações sobre as ofertas, sobretudo o contrato social do ofertante, a certidão de matrícula do empreendimento e o contrato de investimento, para confirmar as condições da oferta, assim como a constituição do título executivo e a formalização das garantias oferecidas.

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