STJ revê entendimento sobre a Recuperação Judicial do Produtor Rural

25/11/2019

Por Roberto Caldeira Brant Tomaz

Por Roberto Caldeira Brant Tomaz
 
Diante da iminência do julgamento do Recurso Especial 1.800.032/MT, pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, abordamos recentemente nesse periódico a polêmica que envolve a Recuperação Judicial do produtor rural.
 
Como exposto no artigo veiculado em 28/10/2019, a Corte Superior se debruçaria sobre a exigência (ou não) de que o produtor rural esteja devidamente inscrito na Junta Comercial da sua sede há pelo menos 2 anos, para que possa pedir recuperação judicial, de acordo com a estrita interpretação do art. 48 da Lei 11.101/2005, cumulado com art. 971 do Código Civil.
 
A expectativa era de que o STJ mantivesse o entendimento já exarado no julgamento do REsp 1.193.115-MT, em 2013, confirmando a exigência legal. Todavia, não muito diferente do que vem ocorrendo com preocupante frequência, a Corte decidiu rever seu posicionamento e flexibilizar o requisito previsto em lei, para incluir na recuperação judicial do produtor rural toda a dívida existente antes do registro, considerando a inscrição como simples reconhecimento de uma condição de fato.
 
O Relator do recurso, Ministro Marco Buzzi, iniciou o julgamento mantendo o entendimento vigente e foi acompanhado pela Ministra Isabel Gallotti. O Ministro Raul Araújo, contudo, inaugurou a divergência,  vindo a ser seguido pelos Ministros Antônio Carlos Ferreira e Luis Felipe Salomão. O resultado, portanto, foi 3×2 para a revisão do posicionamento.
 
A nosso ver, trata-se de mais um julgamento político, em que a lei foi suplantada, em prol do interesse de grupos expressivos, no caso, os mega empresários do agronegócio. O entendimento para dispensar o requisito temporal de 2 anos, contrariamente à intenção normativa, privilegia os interesses do setor ruralista e impõe todo o ônus do inadimplemento aos credores, em especial as instituições financeiras e os fundos de recebíveis.
 
Como demonstrado anteriormente, é provável que a autorização repentina e indiscriminada da recuperação judicial do produtor rural gere um grande impacto na economia, especialmente no setor de fomento e financiamento da produção, à medida que os agropecuaristas, em gritante violação ao princípio da boa-fé contratual e da segurança jurídica das relações privadas, tenham seus créditos incluídos inesperadamente em processo recuperacional, pelo simples registro em órgão competente, em contrapartida à expectativa do credor que lhe concedeu o crédito.
 
É uma mudança de regras no meio do jogo que desequilibra as relações comerciais. Por isso o registro do produtor rural como empresário poucos dias antes do pedido de recuperação judicial causa grande desconforto no mercado financeiro e nos demais fomentadores da atividade rural no Brasil.
 
A decisão do STJ vai inverter a regra de que o produtor rural seja beneficiado com a concessão de juros menores, mudando a forma como se financia o agronegócio no país. A possibilidade de sofrer um revés por meio da recuperação judicial do produtor rural aumentará a avaliação de risco por parte das instituições financeiras, levando ao aumento do custo do crédito.
 
Embora não se possa afirmar categoricamente a repercussão e os desdobramentos do julgado – contra o qual ainda cabe recurso -, muito melhor seria se a questão fosse debatida no Congresso, propondo-se um estatuto específico que resolvesse a insolvência do produtor rural, sem sacrificar as garantias conferidas ao credor. Que houvesse uma mera alteração da lei falimentar vigente, de forma a incluir a previsão de exclusão da Cédula de Produto Rural dos efeitos da recuperação judicial, tal como ocorre com os créditos garantidos por alienação fiduciária.   
 
Dessa forma, o Legislativo impediria a usurpação da sua competência pelo Judiciário, como vem ocorrendo de forma indiscriminada no âmbito da Corte Superior.
 
Havendo ou não uma mobilização parlamentar no sentido de aperfeiçoar a legislação aplicável, os operadores do Direito precisam estar bem preparados, agindo cada vez mais de maneira preventiva no atual cenário de insegurança jurídica.

Compartilhe

Vistos, etc.

Newsletter do
Teixeira Fortes Advogados

Vistos, etc.

O boletim Vistos, etc. publica os artigos práticos escritos pelos advogados do Teixeira Fortes em suas áreas de atuação. Se desejar recebê-lo, por favor cadastre-se aqui.