A insegurança jurídica nas decisões contraditórias do STJ

06/02/2020

Por Teixeira Fortes Advogados Associados

A principal função do Superior Tribunal de Justiça é uniformizar a interpretação da lei federal em todo o Brasil, seguindo os princípios constitucionais e a garantia e defesa do Estado de Direito. Porém, não raro, vemos a própria Corte proferir decisões contraditórias ou mesmo conflitantes entre si, ocasionando enorme insegurança jurídica aos jurisdicionados.

Conforme restou abordado no artigo que publicamos em 01/07/2019, em decisão inovadora, o STJ proferiu acórdão[1] deliberando acerca da relativização da impenhorabilidade do salário para pagamento de crédito sem natureza alimentar, dando interpretação extensiva ao disposto pelo artigo 833, inciso IV do Código de Processo Civil.

Referida decisão representou um avanço contra a proteção exacerbada do devedor, demonstrando que a jurisprudência daquela Corte caminha em favor dos credores, equilibrando os interesses de uma e outra parte. Vale dizer que, se é certo que deve ser preservado o necessário à existência do devedor e de sua família, é certo, também, que não é por qualquer pretexto que ele pode se furtar ao pagamento das suas obrigações.

Abordamos, também, no artigo publicado em 02/09/2019, a importância da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça relacionada  à relativização da impenhorabilidade da conta poupança para a recuperação de créditos de devedores que a utilizam para ocultação de recebíveis, movimentando-a como se conta corrente fosse, para frustrar a penhora buscada por seus credores.

As citadas decisões são de suma importância para a atuação na área de recuperação de créditos, pois permite o alcance de ativos financeiros que, até então, eram totalmente blindados, mediante atos praticados com má-fé.

Em que pese as decisões favoráveis comentadas, é certo que no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n.º 1.330.567/RS, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça proferiu decisão estendendo a impenhorabilidade garantida às contas de poupança para valores que o devedor “poupe” na sua conta corrente:

A Seção concluiu, por maioria, no julgamento antes mencionado, ser possível ao devedor poupar valores sob a proteção da impenhorabilidade no patamar de até 40 (quarenta) salários mínimos, não apenas aqueles depositados em cadernetas de poupança, devendo ser incluída na proteção legal a quantia depositada em conta-corrente ou fundos de investimento, bem como aquela guardada em papel-moeda”.

Importante esclarecermos que referida decisão foi proferida em caso isolado, no qual o recorrente conseguiu efetivamente comprovar que a quantia então penhorada, embora mantida em conta corrente, representava concretamente uma reserva de natureza alimentar.

Com o passar do tempo, as circunstâncias que deram ensejo a prolação da referida decisão perderam-se entre outros temas, passando aquele aresto ser arguido de forma totalmente descontextualizada nos casos posteriores. Resultado: alguns devedores têm se valido daquele acórdão para obter o desbloqueio de qualquer valor penhorado via sistema Bacenjud.

Por essa razão, outras decisões neste mesmo sentido foram proferidas pelo STJ de forma descontextualizada, como a mais recente, nos autos do Agravo Interno nos Embargos de Declaração no Agravo em Recurso Especial nº. 1.448.029/SP, julgado em 17 de setembro de 2019 pela Quarta Turma.

As decisões retro conflitantes no âmbito do STJ representam, infelizmente, ameaça à segurança jurídica almejada, inclusive, pela nova legislação processual, que tratou de regrar a busca pela uniformização da jurisprudência.

Os julgados citados nos trazem um importante alerta acerca da necessidade de que haja, de fato, a unificação da jurisprudência da Corte. A equipe do Teixeira Fortes teve a oportunidade de despachar com um dos Ministros do STJ justamente para sanar o conflito decorrido da incorreta aplicação dessa decisão ao caso em que os valores bloqueados na conta corrente do devedor não decorriam de poupança ou salário.

Temos observado que, após a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, alguns Ministros do STJ têm se posicionado de forma ativa, convocando as Turmas julgadoras em seções especiais com o objetivo de solucionar temas conflitantes e uniformizar a jurisprudência da Corte.

Acreditamos na inclusão desse tema na pauta de julgamento das seções do STJ para uniformização e harmonização das decisões envolvendo a penhora de valores nas contas bancárias, com aquela importante decisão que relativizou a impenhorabilidade do salário. Os profissionais do Teixeira Fortes acompanharão de perto.


[1] STJ – Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial, nº. 1.336.881/DF

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