O STJ divulgou no último dia 12/02/2020 a afetação de recursos especiais a serem julgados pelo rito dos recursos repetitivos, tendo por objeto a penhora de percentual do faturamento de empresas no âmbito das execuções fiscais, para definir, entre outras questões, se a medida é excepcional e se representa algum prejuízo ao princípio da menor onerosidade ao devedor.
Recurso Repetitivo
Segundo o STJ, o recurso repetitivo “[…] representa um grupo de recursos especiais que tenham teses idênticas, ou seja, que possuam fundamento em idêntica questão de direito”.
A sistemática dos recursos repetitivos tem o objetivo de garantir a segurança jurídica com a uniformização das decisões judiciais, ou seja, assegurar que uma determinada questão seja julgada da mesma forma por qualquer Juiz ou Tribunal.
Daí a sua relevância, pois, depois de julgado o tema afetado como repetitivo, todos os Juízes e Tribunais do país deverão segui-lo, conforme determina o artigo 927, inciso III, do Código de Processo Civil[1].
Tema 769: penhora de faturamento no âmbito da execução fiscal
A questão a ser definida pelo Tema 769 é se a penhora de faturamento requerida nas execuções fiscais é medida excepcional, a ser realizada depois de esgotados os outros meios para penhora de bens, e se implicaria em um prejuízo ao princípio da menor onerosidade ao devedor, expresso no artigo 805 do Código de Processo Civil[2].
A discussão tem lugar, pois o Estado goza de certos privilégios na execução dos seus créditos, um deles é a preferência no seu pagamento em detrimento dos credores cíveis, exercendo, portanto, maior poder de coerção sobre o devedor e o seu patrimônio.
Os recursos representativos dessa controvérsia são de execuções fiscais oriundas do estado de São Paulo, em que a Fazenda Pública defende a possibilidade de penhorar percentual do faturamento da empresa devedora independentemente de localizar outros bens, já que essa constrição se identifica com a penhora de dinheiro e que está em primeiro lugar na ordem de constrição.
Diferente da execução civil e que prevê no artigo 835 do CPC, ordem preferencial de constrição de bens, a Lei de Execução Fiscal 6.830/80 determina que as penhoras obedeçam a ordem disposta no artigo 11, cujo parágrafo 1º traz, como medida excepcional, a penhora sobre estabelecimento comercial, compreendida aí a constrição do faturamento. Esse, aliás, o fundamento[3] usado pelos devedores fiscais para defenderem a excepcionalidade da medida.
A Penhora de faturamento nas execuções cíveis
Como nós já abordamos em outra oportunidade, a penhora de percentual de faturamento é uma alternativa para a recuperação de crédito nas execuções cíveis, nos processos em que não foram localizados bens dos devedores, passíveis de penhora, em especial dinheiro, imóveis e veículo.
Os Tribunais de Justiça e o STJ admitem a constrição entre 5% e 10% do faturamento da empresa devedora, eventualmente 15%, após o credor demonstrar o insucesso na penhora de outros bens.
Embora a orientação nas execuções cíveis seja a de excepcionalidade da medida, a sua realização é analisada caso a caso e pode ser autorizada antes da tentativa de penhorar outros bens, a depender dos elementos apresentados pelo credor.
Foi o que ocorreu no recurso 2233594-26.2019.8.26.0000, em que o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a constrição de 15% do faturamento da devedora, que defendia a tese de que o credor não tentou penhorar outros bens após o resultado negativo do Bacenjud. Nesse caso, entendeu-se que a devedora deixou de indicar outros bens que poderiam ser constritos no lugar do seu faturamento:
“A agravante, embora se insurja contra o fato de não ter o exequente esgotado os meios para localização de outros bens, não indica, como deveria, em quais bens poderiam recair novas penhoras, o que torna inútil essa assertiva e, até certo ponto, fora de propósito.
Embora a penhora sobre o faturamento seja medida excepcional, no caso em análise se mostra legal e justificada, diante do quadro fático apresentado, em que não foram localizados ativos financeiros nas contas bancárias da executada. Não há que se falar em violação ao artigo 805 do Código de Processo Civil.”[4]
Sobre o princípio da menor onerosidade, ele não é absoluto. A nova legislação processual dispõe no parágrafo único do artigo 805, CPC[5] que o devedor que alegar que a penhora realizada pelo credor é mais gravosa, deve indicar ‘outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados’. O Código de Processo Civil de 1973 não continha essa disposição.
O parágrafo único do artigo 805 do novo Código de Processo Civil expressa o objetivo do legislador de dar maior efetividade aos processos de execução, refletindo a orientação dos Tribunais de coibir os abusos dos devedores recalcitrantes, que buscam se furtar do pagamento das suas dívidas sob qualquer pretexto.
Conclusão
As teses a serem definidas pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 769 são para os pedidos de penhora de faturamento de empresas nas execuções fiscais, pois como demonstramos, a Lei 6.830/80 estabelece no artigo 11 a ordem que as constrições devem ser realizadas. Por conta dessa norma, a Fazenda Pública só poderia penhorar o faturamento de um devedor depois de realizar as constrições relacionadas na referida norma.
O Tema 769 não se aplica, portanto, às execuções cíveis!
Embora a orientação, nos processos cíveis, seja o de excepcionalidade da medida, vimos que ela pode ser realizada antes da localização de outros bens, quando demonstrada a sua efetividade em relação à outra medida executiva, importando ressaltar que a ordem de penhoras do artigo 835, CPC é preferencial, o que significa que o credor não precisa realizar as medidas dispostas nos incisos I ao IX, para então pedir a constrição do faturamento do devedor, prevista no inciso X.
Para ler a notícia na íntegra, clique aqui.
Fonte STJ: Primeira Seção afeta recursos relativos à penhora sobre faturamento de empresa
[1] Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
[…]
III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
[2] Art. 805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.
[3] Art. 11 – A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:
[…]
§1º – Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em plantações ou edifícios em construção.
[4] TJSP, Agravo de Instrumento nº 2233594-26.2019.8.26.0000, Rel. Des. Marino Neto, julgamento 25/01/2020.
[5] Art. 805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.
Parágrafo único. Ao executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados.
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