O Tribunal de Justiça do Paraná, em acórdão proferido em recurso patrocinado pelo Teixeira Fortes,[1] aplicou as normas da CVM e o aresto do Superior Tribunal de Justiça – REsp 1.726.161/SP[2] – explorados na defesa do credor, para validar a coobrigação, ou seja, a responsabilidade do cedente e dos responsáveis solidários pelo pagamento dos títulos cedidos.
A decisão é extremamente importante, porque a Relatora do recurso levou em consideração todas as peculiaridades da operação, informadas pelo credor para fundamentar o seu voto – cláusulas contratuais, normas e julgados específicos ao caso –, algo fundamental para a formação de jurisprudência qualificada em favor dos FIDCs, visto que esse acórdão servirá de parâmetro para outros julgamentos, inclusive de outros Tribunais de Justiça do país. Vejamos:
“[…] o apelado possui as seguintes características: i) trata-se de condomínio fechado (sem personalidade jurídica própria) formado por recursos obtidos de investidores; ii) é administrado por uma instituição financeira e se submete à regulação setorial pelo Banco Central do Brasil, por intermédio do Conselho Monetário Nacional e pela Comissão de Valores Mobiliários; e possui como finalidade e exerce como atividade econômica justamente a aquisição iii) de direitos de crédito ou creditórios, via cessões de crédito onerosas.
[…]
Portanto, o FIDC, mediante cessão de crédito, adquire os direitos creditórios que uma empresa tem a receber, assumindo os riscos da solvência dos créditos, mediante pagamento de um deságio no ato da cessão. Ressalta-se, ainda, que os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios são disciplinados pela Resolução do CMN/Bacen nº 2.907, de 29 de novembro de 2001, e pela Instrução da CVM nº 356, de 17 de dezembro de 2001.
[…] embora os FIDC e a atividade de factoring guardem semelhança, recentemente a Corte Superior, no julgamento do REsp nº 1.726.161/SP, sedimentou que não se pode confundir um como o outro, sendo que nos contratos de cessão de crédito que têm FIDC como cessionário é válida a estipulação de coobrigação dos cedentes e fiadores pelo inadimplemento dos títulos, diferentemente do que ocorre no fomento mercantil.
[…]
Na hipótese específica dos autos, não se pode olvidar que as partes não celebraram contrato de factoring (ou fomento mercantil), mas sim contrato de cessão de direitos de crédito com fundo de investimento em direitos creditórios (FIDC).
Desse modo, como visto, aplica-se ao caso o disposto no art. 296 do Código Civil: “Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor”.
Destarte, considerando, ainda, a existência de cláusula expressa nesse sentido, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade da empresa cedente e dos responsáveis solidários pela inadimplência dos créditos cedidos, isto é, a validade da cláusula de recompra e de regresso.” (grifamos)
Além da coobrigação, a Relatora reforçou, também, a validade da nota promissória emitida em garantia das obrigações ajustadas no contrato de cessão:
“[…] não há empecilho algum na emissão de nota promissória como garantia de operação de crédito.
[…] extrai-se, da cláusula 12.2 do contrato que deu origem à nota promissória executada, que houve expressa previsão a respeito do título de crédito e, inclusive, restou estabelecida a possibilidade de a execução ser pautada tanto no instrumento contratual quanto na nota promissória.
[…] como já mencionado em tópico anterior, a possibilidade de responsabilização solidária dos recorrentes em virtude do inadimplemento dos títulos pelos terceiros devedores, assim como a cláusula de recompra, foram previamente pactuadas no contrato entabulado entre os litigantes. Logo, a execução em face dos ora insurgentes, em razão dos títulos inadimplidos, não configura comportamento contraditório (venire contra factum proprium non potest), visto que pautada em
cláusulas contratuais previamente estabelecidas.” (grifamos)
Na medida em que a nova legislação processual determina aos Tribunais de todo país a uniformização da sua jurisprudência e observância das orientações das Cortes Superiores (artigos 926 e 927, CPC), vemos a relevância de acórdãos bem fundamentados como esse para sanar os equívocos de outras decisões e atualizar os Julgadores das posições contemporâneas acerca das operações realizadas pelos FIDCs, que se distinguem daquelas aplicadas às factorings.
[1] Recurso de apelação n.° 0014655-26.2018.8.16.0001, Relatora convocada Juíza Vania Maria da Silva Kramer, 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná.
[2] STJ, REsp 1.726.161-SP, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, DJe 03/09/19.
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