Em recentes decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), contribuintes conseguiram o direito de não recolherem o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre a parcela do usufruto.
Em linhas gerais, o usufruto é o direito de ter a posse e obter renda e benefícios sobre o bem. O bem é transmitido por doação e o indivíduo que o recebeu detém a posse, mas não a propriedade do bem. O usufruto é comumente utilizado no planejamento sucessório, quando uma pessoa doa bens em vida, a fim de evitar discussões futuras entre os herdeiros. Quem se beneficia do usufruto, detendo a posse e as rendas do bem, é o usufrutuário, e aquele que tem somente a expectativa da disponibilidade do bem, ao final do usufruto, é o nu-proprietário.
Uma situação muito comum, por exemplo, ocorre quando um pai doa um imóvel em vida para o filho, mas mantém o usufruto para si, o que lhe dá direito a deter a posse do imóvel enquanto estiver vivo, bem como explorá-lo economicamente, recebendo aluguéis e lucros sobre a propriedade, por tempo determinado ou vitalício (até a morte do usufrutuário). O filho só terá a propriedade plena do imóvel quando acabar o usufruto ou quando o pai vier a falecer.
No Estado de São Paulo, a Lei nº 10.705/2000 atualmente prevê a alíquota de 4% para o ITCMD. No caso de doação com reserva de usufruto, o ITCMD poderá ser pago em sua totalidade ou de forma fracionada.
No pagamento fracionado, é utilizado como base de cálculo 2/3 (dois terços) do valor de referência do bem na data da doação da nua-propriedade, e o restante 1/3 (um terço) na data da consolidação da plena propriedade pelo nu-proprietário, quando o usufruto é extinto.
Entretanto, nos últimos anos algumas Câmaras de Direito Público do Tribunal de Justiça de SP vêm decidindo, de forma favorável aos contribuintes, que a cobrança da parcela final do ITCMD na extinção do usufruto é ilegal.
No caso discutido no processo nº 1046966-50.2019.8.26.0224, a Fazenda do Estado de São Paulo exigia da contribuinte o pagamento do ITCMD, alegando que o valor era devido por conta de doação realizada anteriormente com reserva de usufruto vitalício.
Como o usufrutuário faleceu, o usufruto se extinguiu e em razão disso, a nu-proprietária deveria pagar a parcela restante sobre 1/3 do valor do bem, além dos 2/3 do valor do bem que já havia sido recolhido no ato da doação, visto que agora receberia a plena e definitiva propriedade do imóvel.
Ao julgar o caso, a 13ª Câmara de Direito Público proferiu decisão unânime favorável à contribuinte, sob a fundamentação de que o artigo 6º, inciso I, “f”, da Lei Estadual nº 10.705/2000, expressamente prevê a isenção do ITCMD no caso de extinção do usufruto nos casos em que o nu-proprietário tenha sido o seu instituidor:
“Artigo 6º – Fica isenta do imposto:
I – a transmissão ‘causa mortis’:
(…)
f) na extinção do usufruto, quando o nu-proprietário tiver sido o instituidor.”
No acórdão restou decidido que em razão de tal dispositivo, “a extinção/cancelamento do usufruto não figura entre as hipóteses de incidência do ITCMD previstas em lei, pois não se trata de transmissão de bem “causa mortis”, sequer de doação, tratando-se, em verdade, de consolidação da propriedade plena na pessoa do nu-proprietário.”
Isso significa que no estado de São Paulo a cobrança do imposto deveria incidir apenas sobre 2/3 do valor do bem no momento da sua doação, não cabendo a cobrança na extinção do usufruto, “na medida em que tal fato somente aperfeiçoa a propriedade já adquirida quando da doação.”
Restou também destacado pelos desembargadores que a Decisão Normativa CAT/SP nº 3/2010 prevê que não cabe a cobrança de ITCMD sobre a extinção do usufruto, seja pela morte ou pela renúncia do usufrutuário:
“4. a consolidação da propriedade plena, pela extinção do usufruto, seja pela morte ou pela renúncia do usufrutuário, não pode ser considerada sucessão legítima ou testamentária e não se caracteriza como doação.”
No mesmo sentido, já foram proferidas decisões também nas 1ª e 3ª Câmaras de Direito Público do TJ-SP:
“No âmbito do Estado de São Paulo, a Lei nº 10.705/2000 isentou expressamente da incidência de ITCMD a extinção do usufruto nas situações em que o nu-proprietário tiver sido o instituidor do direito real como ocorreu no caso dos autos.
(…)
Logo, é o caso de conceder a ordem para determinar que autoridade coatora se abstenha de exigir o recolhimento de ITCMD sobre a extinção e/ou cancelamento do usufruto dos imóveis descritos na inicial, em razão da renúncia da usufrutuária.” (Processo nº 1019676-59.2017.8.26.0053).“No presente caso, ao contrário do que sustenta a Fazenda do Estado em sua defesa, extrai-se da escritura de compra e venda e doação acostada a fls. 19/24, que foi certificado o recolhimento do imposto sobre a transmissão, na base de 2% sobre a totalidade do valor venal do imóvel (R$ 54.526,00 apartamento e R$ 13.492,00 – garagem) nas importâncias de R$ 1.090,52 e R$ 269,84, como bem destacado pelo Magistrado “a quo”.
Assim, não se vislumbra a ocorrência de fato gerador do ITCMD pela simples extinção do usufruto, uma vez que já foi recolhido integralmente o tributo no momento da doação.” (Processo nº 1039002-68.2018.8.26.0053).
Cumpre salientar que o entendimento trazido pelas decisões somente é aplicável ao estado de São Paulo, vez que a legislação do ITCMD varia conforme o estado. É sempre recomendável a análise prévia da legislação estadual para cada caso em particular, a fim de verificar se a cobrança do imposto é devida ou não.
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