STF muda radicalmente a forma da atualização dos créditos trabalhistas

23/03/2021

Por Denis Andreeta Mesquita

No apagar das luzes do ano judiciário, em sua última sessão plenária de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar as ADIs 5867 e 6021, e ADCs 58 e 59, surpreendendo a muitos, determinou ser inconstitucional a aplicação da Taxa Referencial (TR) para a correção monetária dos créditos trabalhistas e depósitos recursais.

Prevaleceu, dada a maioria, o voto do Relator, Ministro Gilmar Mendes, trazendo como dispositivo:

“Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes as ações diretas de inconstitucionalidade e as ações declaratórias de constitucionalidade, para conferir interpretação conforme a Constituição ao artigo 879, §7º, e ao artigo 899, §4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 2017. Nesse sentido, há de se considerar que à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho deverão ser aplicados, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral, quais sejam a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa Selic (artigo 406 do Código Civil)” (julgado em 18/12/20, vencidos os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio). (g/n)

Com efeito, “até que sobrevenha solução legislativa”, os créditos trabalhistas serão corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-E) na fase pré-judicial e, a partir da citação, a correção será pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC).

Não se atendo somente ao dispositivo supra reproduzido, fato é que aludida decisão afastou os juros de mora na Justiça do Trabalho. Doravante, repisa-se, até que o Poder Legislativo delibere sobre a questão, há de ser utilizado o artigo 406 do Código Civil, que por sua vez expressa que quando não forem convencionados, os juros moratórios serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, que atualmente é a taxa Selic e que no entender da mais alta corte judiciária engloba tanto os juros quanto a correção monetária.

Almejando dirimir dúvidas que certamente apareceriam, a parte final do voto condutor, do Ministro Gilmar Mendes, fixou os parâmetros a serem seguidos:

“Desse modo, para evitarem-se incertezas, o que ocasionaria grave insegurança jurídica, devemos fixar alguns marcos jurídicos. Em primeiro lugar, são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês.

Por outro lado, os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (artigo 525, §§ 12 e 14, ou artigo 535, §§ 5º e 7º, do CPC).

Igualmente, ao acórdão formalizado pelo Supremo sobre a questão dever-se-á aplicar eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de atingir aqueles feitos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais).”

E, assim, foram modulados os efeitos da decisão (i) os pagamentos já realizados utilizando-se IPCA-E, TR ou qualquer outro índice, com juros de 1% ao mês deverão ser reputados válidos; (ii) deverão ser mantidas as decisões transitadas em julgado que expressamente adotaram a TR ou o IPCA-E e os juros de mora de 1% ao mês; (iii) aos processos em curso, inclusive na fase recursal, deverá ser aplicada de forma retroativa a SELIC, e; (iv) para os processos já transitados em julgado, sem que se tenha manifestação expressa quanto ao índice de correção monetária e taxa de juros a SELIC deverá ser aplicada.

A decisão possui eficácia erga omnes e efeito vinculante, sendo que já se verifica a sua adoção em sentenças e acórdãos recentemente proferidos.

Contudo, alguns magistrados vêm entendendo de modo diverso. Tal posicionamento, contrário à decisão do STF objeto deste artigo, já foi objeto de uma reclamação (RCL 46023) perante a suprema corte e decidida monocraticamente pelo Ministro Alexandre de Moraes, na data de 03/03/2021, em que o juiz de origem aplicou o IPCA-E na fase pré-judicial, e, a partir da notificação da empresa, decidiu pela incidência da SELIC, acrescida de juros de mora.

Na decisão, o Ministro Alexandre de Moraes explicou que “a taxa SELIC é um índice composto, isto é, serve a um só tempo como indexador de correção monetária e também de juros moratórios, nos termos do art. 406 do Código Civil” e, portanto, a aplicação dos juros afrontaria o decidido nas ADIs 5867 e 6021 e ADCs 58 e 59.

Este novo posicionamento, mormente pela exclusão dos juros moratórios, trouxe uma mudança radical na correção dos créditos trabalhistas, reduzindo significativamente o crédito perseguido e beneficiando sobremaneira os devedores, que já comemoram a nova forma de atualização enxergando a diminuição de seus passivos trabalhistas.

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