Em ação que discute vícios construtivos fora determinado, em primeira instância, que a construtora, ré da ação, pagamento honorários periciais, sob o argumento de que, em se tratando de relação de consumo, haveria a inversão do ônus da prova, e consequentemente, caberia ao réu pagar pela perícia necessária ao autor.
Mas o Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso de agravo de instrumento interposto pelo réu, asseverando que a “inversão do ônus probatório não acarreta, necessariamente, a obrigação da parte contrária de suportar as despesas com a perícia” (AI 2022217-71.2021.8.26.0000).
Ônus da prova é o instituto do direito que determina quem tem a incumbência de provar determinado fato ou alegação em um processo. Na regra geral, art. 333 do CPC, incumbe ao autor provar os fatos que constituem o direito que alega ter e, ao réu, provar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. A inversão do ônus da prova, por seu turno, é o instituto do ordenamento jurídico que permite a inversão do ônus de provar determinado fato, alterando a regra geral, como ocorre nas relações consumeristas, por hipossuficiência de uma das partes, ou como previsto atualmente pelo § 1º do art. 373 do CPC, que permite a atribuição do ônus da prova à parte que tiver maior facilidade de produzi-la.
Baseado no instituto da inversão do ônus da prova é que o Juízo de primeiro grau impôs ao réu da ação o custeio da perícia, entendendo que, por se tratar de relação consumerista, deveria ser atribuído ao réu da ação o dever de custeio da prova, que, entretanto, havia sido solicitada pela parte autora. Aqui um outro pequeno esclarecimento. Pela regra geral, art. 95 do CPC, deve custear a prova pericial a parte que a solicitou, ou ela deverá ser rateada, quando requerida por ambas as partes ou determinada pelo juiz.
Foi com base em tais premissas que o Tribunal de Justiça reformou a decisão de primeiro grau, asseverando que “Não merece acolhimento a insurgência em relação à inversão do ônus da prova. Isso porque, à luz do art. 373, §1° do Código de Processo Civil, pode o juiz, em atenção às condições fáticas e, em especial, às dificuldades de cumprir o encargo do ônus da prova, atribuí-lo de modo diverso. Nesse aspecto, o Código de Defesa do Consumidor traz, especificamente, a possibilidade da inversão do ônus da prova na tutela dos interesses do consumidor, conforme seu art. 6°, VIII. No mais, não há como confundir o ônus da prova (obrigação de provar os fatos alegados) com o ônus de realização da prova (adiantamento das despesas processuais e honorários periciais). Consoante o art. 95, do Código de Processo Civil, a remuneração do perito será adiantada pela parte que houver requerido a perícia ou rateada quando a perícia for determinada de ofício ou requerida por ambas as partes. Assim, tendo a perícia sido requerida pela parte agravada, é adequado carrear a esta o ônus do pagamento da prova pericial. Nesse sentido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “A jurisprudência do STJ orienta-se no sentido de que inversão do ônus probatório não acarreta a obrigação de suportar as despesas com a perícia, implicando, tão somente, que a parte requerida arque com as consequências jurídicas decorrentes da não produção da prova” (AgRg no AgRg no AREsp. nº 575905-MS, 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, v. un., Rel. Min. Raul Araújo, em 07/04/2015, DJe de 29/04/2015)”.
Em conclusão, desacertada a decisão que impôs o custeio da prova pericial àquele que não a requereu, sob o argumento de que teria havido a inversão do ônus da prova, o que justificou a reforma da decisão pelo Tribunal, que citou diversos precedentes, todos no sentido de que “a redistribuição do ônus ordinário da prova não se confunde e nem interfere no ônus do adiantamento das despesas processuais” (TJSP, AI 2171176-8.2020.8.26.0000) valendo para esta situação, a regra geral do art. 95 do CPC.
A decisão do Tribunal de Justiça seguiu a linha de jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que “a inversão do ônus da prova, deferida nos termos do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, não significa transferir para a parte ré o ônus do pagamento dos honorários do perito, embora deva arcar com as consequências de sua não-produção” (REsp 651.632/BA, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/03/2007, DJ 25/06/2007, p. 232).
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