Uma importante tese tributária tem sido bastante discutida na justiça por empresas que buscam obter um alívio no caixa. Os contribuintes questionam nessas ações se as contribuições previdenciárias e as destinadas a terceiros podem incidir sobre os valores descontados dos salários dos empregados para custear determinados benefícios, como por exemplo, o vale transporte, vale alimentação e plano de saúde.
Esses benefícios são custeados no formato de coparticipação, ou seja, tanto o empregador como o empregado contribuem com suas respectivas frações. Por exemplo, para custear o vale transporte, a empresa pode descontar do salário do empregado até o limite de 6%, sendo o restante pago pela empresa. Assim, se o vale transporte num determinado mês é de R$200, um empregado com um salário de R$1.000 sofrerá um desconto de R$60, e a empresa pagará o restante (R$140).
A Lei expressamente veda a incidência das contribuições previdenciárias sobre a parcela custeada pela empresa (R$140 no exemplo acima). O que tem sido questionado é se os descontos realizados no salário dos empregados (R$60 no nosso exemplo) também podem ser retirados do cálculo dessas contribuições. Os contribuintes defendem que somente pode entrar no cálculo as verbas que são pagas a título de contraprestação pelo trabalho realizado, o que não seria o caso desses descontos.
A discussão é relevante do ponto de vista econômico, já que a exclusão desses valores da base de cálculo das contribuições previdenciárias pode representar uma redução substancial no valor das contribuições pagas pelo empregador, que contribui mensalmente com uma alíquota de 20%.
A Receita Federal já deixou claro o seu entendimento sobre o assunto na Solução de Consulta Cosit nº 96 de 21 de junho de 2021. Para a Receita, as empresas não podem excluir esses descontos do cálculo das contribuições previdenciárias. A tese defendida pelo fisco é que antes de ser destinado ao custeio dos benefícios, o valor descontado integrou a remuneração bruta devida ao empregado, o que permitiria a incidência das contribuições.
O tema ainda não possui um entendimento sedimentado no judiciário. É possível encontrar decisões para os dois lados nos Tribunais Regionais Federais (TRFs), que julgam os processos relacionados às contribuições previdenciárias. Algumas empresas conseguiram autorização para excluírem esses descontos do cálculo das contribuições previdenciárias nos TRFs da 2ª, 3ª e 5ª região, com jurisdição sobre vários Estados, entre eles São Paulo[1]. O TRF da 4ª região, que abrange os Estados da região sul, vem formando uma jurisprudência favorável ao fisco.
No STJ, o assunto está começando a ser analisado com maior profundidade e as decisões mais recentes têm animado os contribuintes, especialmente no que se refere à exclusão dos valores descontados a título de vale transporte[2]. Os ministros que decidiram a favor das empresas sobre esse ponto argumentaram que o STJ possui entendimento pacificado no sentido de que as contribuições previdenciárias não incidem sobre os valores destinados ao vale transporte dos empregados, em razão de sua natureza indenizatória, inclusive na forma compartilhada de custeio.
Como se trata de uma tese relevante, que envolve uma grande quantidade de empresas interessadas, a expectativa é que o STJ em algum momento terá que analisar a matéria pelo rito dos recursos repetitivos (sistemática na qual o resultado vale para todos os processos), mas não há previsão de quando isso pode acontecer. Enquanto não há uma definição sobre a questão, é aconselhável que o contribuinte leve a discussão ao judiciário a fim de obter a autorização para excluir esses descontos, inclusive para evitar que a empresa fique sujeita ao risco de ser autuada pela Receita Federal.
[1] TRF2: Processo nº 5032219-45.2019.4.02.5101/RJ; TRF3: Processo nº 5002988-49.2021.4.03.0000; TRF5: Processos nº 0821963-38.2019.4.05.8100 e 0821762-46-2019.4.05.8100.
[2] REsp 1.948.867-RS, Min. Assusete Magalhães; REsp 1.936.980-RS, Min. Sérgio Kukina; REsp 1.920.711-PR, Min. Benedito Gonçalves.
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