Em caso de fraude, usufruto sobre imóvel pode ser cancelado

29/11/2021

Por Camilla Imthon Cavalcanti de Albuquerque

Em processo patrocinado pelo Teixeira Fortes, foi determinado o cancelamento de usufruto vitalício instituído sobre quatro imóveis pertencentes à devedora, em razão do reconhecimento de fraude à execução. A decisão, sem dúvida alguma, é uma grande novidade, que trará resultados positivos aos credores.

O caso era uma ação de execução movida em face de uma empresa de cosméticos e sua sócia, em que as pesquisas ordinárias resultaram infrutíferas, apesar da devedora ostentar alto padrão de vida em suas redes sociais. Diante disso, pôde-se perceber que a suposta incapacidade financeira decorria de manobras praticadas pelos devedores para blindarem seu patrimônio das penhoras judiciais, e não de uma crise financeira propriamente dita.

Atento às “engenhosidades” praticadas pelos devedores, diligenciou-se perante os cartórios de registro de imóveis e constatou-se a existência de cinco imóveis de propriedade das executadas. No entanto, um deles havia sido vendido apenas quatro meses após a distribuição da ação, quando já se tinha ciência da tramitação da execução.

Mesmo ciente da tramitação da ação executiva, e de que seus bens responderiam pela dívida perseguida, no momento da transferência do imóvel, tanto a devedora quanto o comprador declararam ciência das ações que tramitavam em face dela, e declararam que a existência delas não prejudicaria o negócio realizado, por supostamente possuir outros bens aptos à satisfação das suas dívidas, que não são poucas.

Acontece que, ao analisar os outros imóveis que a devedora possuía, que supostamente fariam frente ao débito, o credor se deparou com uma situação curiosa: no momento que a devedora alienou um dos imóveis que pertencia a ela, em fraude à execução, instituiu o usufruto vitalício sobre os demais bens em favor de sua genitora, que sequer serviam como residência, tudo como forma de “blindagem” patrimonial.

A credora solicitou a constrição da nua propriedade pertencente à devedora sobre os bens, mas foi além disso.

Ao alienar um imóvel no curso da ação e gravar os demais com cláusula de usufruto vitalício à sua genitora, o credor reuniu elementos de que a instituição de usufruto foi realizada de forma encenada, pois a devedora sabia que se os bens fossem submetidos à hasta pública, não haveria interessados na sua aquisição, visto que a ocupação do imóvel somente ocorreria após a extinção do direito real.

Assim a credora demonstrou, de forma bastante detalhada, que a instituição do usufruto foi utilizada como manobra para inviabilizar a expropriação dos imóveis indicados à penhora, pois os arrematantes teriam que aguardar a extinção do usufruto para exercerem a efetiva posse do bem, e pediu o cancelamento do usufruto sobre os bens, o que foi acolhido pelo MM. Juízo da 26ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Capital/SP. Vejamos a decisão:

“Quanto ao pedido de cancelamento do usufruto, assiste razão à exequente. Devidamente intimada a usufrutuária, não se manifestou.

Denota-se que a instituição do usufruto em favor da genitora da executada se deu em fraude à execução. Em janeiro de 2019, quatro meses após a distribuição da ação, a Executada alienou um imóvel em conjunto com a sua genitora, usufrutuária do bem.

Quando da alienação do imóvel, a executada já tinha ciência da existência da ação, pois a empresa de sua titularidade já havia sido citada em setembro de 2018.

Ora, sabedora da existência da ação e com todos os seus bens imóveis gravados com reserva de usufruto, a executada alienou o imóvel sem o devido pagamento do débito aqui perseguido, tudo a indicar a dilapidação de seu patrimônio e que a instituição do usufruto em favor de sua genitora se deu em flagrante fraude à execução, com o objetivo de lesar credores, pois obsta os atos de expropriação dos bens.

Vale ressaltar, que a usufrutuária é sócia de empresa com propriedade de mais de 20 imóveis (fls. 411 e 413/414), o que afasta a alegação de que a genitora da Executada possa realmente depender da condição de usufruto instituída nos imóveis aqui penhorados. Ante o exposto, REJEITO a presente IMPUGNAÇÃO À PENHORA e DETERMINO O CANCELAMENTO DO USUFRUTO instituído em favor da genitora da executada nos imóveis……”

Com o cancelamento do usufruto sobre os bens, o credor poderá levá-los prontamente a leilão e garantir seu crédito de forma muito mais célere e eficaz.

A decisão é uma novidade na área de Recuperação de Créditos, e um excelente precedente para outros casos, como forma de possibilitar o cancelamento de um gravame instituído pelo próprio devedor no intuito de obstar a expropriação de seu patrimônio, e demonstrar a eles que, malgrado a “expertise” dos devedores, os credores estão afiando o machado e aprimorando as técnicas na recuperação dos ativos.

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