Em ação de execução ajuizada em face de uma empresa de aviamentos, após diversas pesquisas judiciais não trazerem resultados úteis para o processo, a credora foi a campo e encontrou uma lista de clientes da empresa devedora com valores em aberto com ela.
Levada a situação para o juiz, uma vez que, mesmo desenvolvendo normalmente suas atividades com vendas a devedora não dava sinais de querer pagar o débito, a credora solicitou e teve deferida a expedição de ofício para os clientes da executada, a fim de que depositassem judicialmente quaisquer créditos que teriam em favor da devedora.
Ressalta-se que tal medida, apesar de depender de esforços e pesquisas do credor, é permitida pela Lei, pois o artigo 798, inciso II, ‘c’ do Código de Processo Civil impõe que o exequente indique “os bens suscetíveis de penhora, sempre que possível”, além do inciso XIII do artigo 835 do mesmo Código Processual permitir a penhora de outros direitos do devedor.
Na medida em que os clientes da executada foram intimados sobre a penhora deferida, eles realizaram o depósito dos valores judicialmente, até o momento que a empresa de aviamentos optou por interpor recurso da decisão alegando que tal medida se equipararia à penhora sobre o faturamento da empresa, e que seria “medida extrema que compromete a continuidade das atividades da empresa que empregam pessoas, sendo incompatível a penhora com a função social desempenhada pela empresa” (sic).
De acordo com o artigo 835 do Código de Processo Civil, diversos bens podem ser penhorados para a garantia de uma dívida, desde dinheiro em espécie até direitos aquisitivos derivados de compra e venda.
Um dos meios para a recuperação do crédito pode ser a penhora do percentual do faturamento da empresa devedora. Contudo, tal modalidade de penhora não é constantemente utilizada pelos credores em razão das dificuldades que a envolvem, vez que o percentual não pode tornar inviável o exercício da atividade empresarial e a empresa devedora deverá apresentar os balancetes mensais a um administrador judicial nomeado pelo Juiz, quer será o competente para informar qual o valor corresponde ao percentual deferido. Apesar disso, essa espécie de constrição não é mais considerada um meio gravoso, conforme alegam a maioria dos devedores, sendo absolutamente permitida pelo Código de Processo Civil e nos Tribunais do País.
No caso patrocinado pelo Teixeira Fortes, entretanto, o objeto da penhora não era o faturamento da empresa, mas sim os direitos creditórios que a devedora tinha a receber de seus clientes. Embora possam apresentar semelhanças, não se pode concluir que a penhora sobre o crédito individualizado se equipare sempre à penhora do faturamento. Isso porque a primeira pode ser apenas uma parte de todo o faturamento da empresa, cabendo ao devedor comprovar que a penhora de tal montante inviabilizará a continuidade de suas atividades.
Apesar de deferir o efeito suspensivo para obstar o levantamento dos valores bloqueados até o trânsito em julgado do recurso, a 20ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento ao agravo de instrumento da executada, destacando principalmente que “a penhora de créditos do devedor é prevista no artigo 855, e seguintes, do CPC, e não pode ser confundida com a penhora sobre o faturamento, que sofre restrições em razão do princípio da preservação da empresa”. Vejamos outros trechos do acórdão:
“Não se trata de penhora de recebíveis da ora agravante perante operadoras de meios de pagamento. É que a penhora de recebíveis dirigida indistintamente às operadoras de meios de pagamento, dado o alcance abrangente da medida, realmente pode ser considerada equivalente à penhora de faturamento, nos termos do artigo 866, do CPC. Entrementes, a situação dos autos é diversa.
Na realidade, a exequente postulou a penhora dos direitos creditórios que porventura as executadas Ana Gi Aviamentos e Absoluta Aviamentos possuem em face de terceiros (empresas elencadas às fls. 140/141 do original). […]
No caso concreto, a agravante não trouxe indícios de que a penhora de eventuais créditos que possui perante os terceiros, elencados na lista trazida pelo exequente, prejudicará substancialmente seu faturamento. Não foram apresentados elementos concretos para fundamentar a genérica alegação de inviabilização da continuidade da atividade, em função da penhora sobre recebíveis.
Note-se que não houve pagamento voluntário, nem indicação de bens à penhora. Assim, embora a execução deva seguir, entre outros, com observação do princípio da menor onerosidade para o devedor, o fato é que a agravante não ofereceu alternativas à penhora de recebíveis.
Ademais, em nenhum momento houve deferimento de penhora de faturamento, mas sim de penhora de créditos da executada, consoante artigos 855 e seguintes do Código de Processo Civil. […]”
Conforme se verifica dos trechos acima, certo é que a expedição de ofício para clientes da parte executada na busca de recebíveis penhoráveis não se equipara à penhora do faturamento da empresa, sendo que os requisitos para deferimentos de tais medidas são diferentes.
De qualquer forma, os juízes e Tribunais estão cada vez mais atentos para que tal princípio não sirva de escudo para fomentar o inadimplemento e a blindagem de bens.
Constantemente os executados requerem a aplicação do princípio da menor onerosidade ao devedor, previsto no artigo 805 do Código de Processo Civil[1]. No entanto, eles se esquecem que a execução se processa no interesse do credor (art. 797 do CPC[2]) e, quando não indicam bens menos gravosos e que garantam integralmente a dívida executada, estão sujeitos à manutenção da penhora dos bens solicitados pelo exequente.
[1] Art. 805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.
[2] Art. 797. Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal, realiza-se a execução no interesse do exequente que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens penhorados.
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