Mudanças no Crowdfunding abrem novas oportunidades de captação de investimento

20/06/2022

Por Viviane Ramos Nogueira

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) editou, em 27 de abril deste ano, a Resolução CVM n° 88, que substitui a Resolução CVM 588/17, e traz novas diretrizes referentes à oferta pública de valores mobiliários de emissão de sociedades empresárias de pequeno porte, realizada com dispensa de registro por meio de plataforma eletrônica de investimento participativo, o crowdfunding, e tem por fim assegurar a proteção dos investidores e possibilitar a captação pública por parte destas sociedades.

Entende-se por sociedade empresária de pequeno porte a sociedade empresária constituída no Brasil, não registrada como emissora de valores mobiliários perante a CVM, e com receita bruta anual, apurada no exercício social encerrado no ano anterior à oferta, de até R$ 40 milhões.

As principais premissas do crowdfunding são a economia colaborativa e a identificação do público. E nesse cenário, em 2021, o segmento apresentou evolução de 123%, com captação de mais de R$ 180 milhões[1], de modo que aumentasse as demandas para a implementação de melhorias à regulamentação do crowdfunding.

Após cinco anos de vigência da Resolução CVM 588/17, a CVM buscou, por meio da edição da Resolução CVM 88, que entrará em vigor a partir de 1 de julho deste ano, implementar essas melhoras à regulamentação . Os novos contornos para o cenário de investimento serão:

a) Conceito de sociedade empresária de pequeno porte: nessa categoria, serão consideradas as empresas que possuem como receita bruta anual ao exercício social anterior à oferta de até R$ 40 milhões. Também aumentou de R$ 10 milhões para R$ 80 milhões o valor-limite da receita bruta consolidada anual, registrada no exercício social anterior à oferta, de sociedade que seja controlada por outra pessoa jurídica ou fundo de investimento;

b) Valor máximo de captação: A nova regulação do crowdfunding aumenta o limite de captação pública para até R$15 milhões, o que representa um aumento do porte dos investimentos alvo, pois na primeira resolução a previsão era de no máximo R$5 milhões. Além disso, o prazo de captação não poderá ser superior a 180 dias, que devem ser definidos antes do início da oferta;

c) Prazo para desistência da ordem de investimento: Os investidores poderão desistir do investimento em, no mínimo, cinco dias contados da confirmação do investimento;

d) Medida de proteção dos Investidores por meio de escrituração dos valores mobiliários objeto da oferta: será necessária a escrituração, feita por escriturador registrado na CVM ou de controle de titularidade e de participação societária feito pelas plataformas, e haverá o controle de titularidade e de participação societária.

Os serviços de escrituração deverão ser obrigatoriamente contratados, caso: no momento da contratação de uma plataforma, a sociedade já tenha realizado, em outra plataforma, uma ou mais ofertas de valores mobiliários fungíveis com aquele objeto da oferta, nele conversíveis ou que se convertam na mesma espécie de valor mobiliário; ou, caso a plataforma contratada para distribuir a oferta não ofereça os serviços de controle de titularidade e de participação societária.

E para o controle de titularidade e de participação societária, será necessário que a sociedade empresária de pequeno porte emissora do valor mobiliário celebre contrato específico para esta prestação de serviços, que deverá dispor, no mínimo: regras aplicáveis ao atendimento dos titulares dos valores mobiliários; a descrição dos procedimentos operacionais que disponham sobre obrigações, deveres e responsabilidades da plataforma; a confidencialidade da informação.

Além disso, a obrigação de escrituração ou de controle de titularidade e de participação societária somente se aplica aos valores mobiliários ofertados após a entrada em vigor da Resolução CVM 88 (1° de julho de 2022).

e) Destinação dos recursos da oferta: Os recursos captados na oferta não poderão ser utilizados para a aquisição, direta ou por meio de títulos conversíveis, de participação minoritária (até 50% do capital social votante) em outras sociedades.

f) Divulgação das Rodadas Abertas e Realização de campanhas: houve a flexibilização das formas de divulgação das ofertas públicas, por meio da permissão da realização de campanhas de promoção em veículos de comunicação e mídias sociais, que veicularão: o tipo de valor mobiliário ofertado; os valores alo mínimo e máximo da captação; eventual valor mínimo de investimento; e, breve histórico e descrição das atividades da sociedade empresária de pequeno porte;

g) Aumento do capital social mínimo integralizado: R$200 mil

h) Profissional de Compliance: será necessária a contratação de profissional de compliance ao alcançar o valor de R$30 milhões em ofertas públicas intermediadas e deverá ser nomeado até 1° de março do exercício seguinte àquele em que for verificada a condição descrita acima.

i) Limitação do investimento: O investidor que tem até R$200 mil em investimentos financeiros ou renda bruta, poderá investir até R$20 mil/ano, salvo as exceções elencadas no Art. 4ª da resolução em comento (investidores qualificados, conforme definição constante do artigo 12 da Resolução da CVM 30/21; investidor líder, nos termos da Resolução CVM 88; ou investidores cuja renda bruta anual ou montante de investimentos financeiros seja superior a R$ 200 mil, hipótese em que o limite de R$ 20 mil seria aumentado para até 10% do maior entre os dois valores (investidor permitido).

j) Contratação de auditoria das demonstrações financeiras: será necessário divulgar previamente à realização da oferta pública as demonstrações financeiras da sociedade, que deverão ser auditadas por auditor independente registrado na CVM, nos seguintes contextos: 1. Antes da realização da oferta, quando: o valor captado na oferta ultrapassar R$10 milhões; ou a partir de R$10 milhões em receita bruta no exercício anterior; 2. Após a realização da oferta, caso sociedade tiver registrado no exercício social anterior receita bruta anual consolidada superior a R$ 10 milhões.

k) Plataformas cadastradas na CVM: As plataformas já cadastradas na CVM antes da entrada em vigor da Resolução CVM 88 devem: 1. em até 6 meses contados da entrada em vigor da resolução, encaminhar à autarquia comprovação de cumprimento do capital social integralizado mínimo; e, 2. caso tenha intenção de prestar serviços de controle de titularidade de valores mobiliários, enviar à CVM declaração de que estão aptas a prestar tais serviços, considerando as exigências estipuladas pela resolução;

l) Uso de recursos para aquisição: As sociedades empresárias de pequeno porte poderão utilizar parte dos recursos captados para adquirir controle de outras empresas em uma aquisição;

m) Intermediação de Transações Secundárias: Agora os “investidores ativos” (investidor cadastrado na plataforma e que, cumulativamente esteja com o seu cadastro atualizado; e tenha realizado investimento em ao menos uma oferta pública conduzida pela plataforma nos últimos 2 anos, conforme a definição da CVM) vão poder mostrar suas intenções de compra e venda dentro dos sistemas das plataformas, que poderão ajudar na realização da transação secundária.

Moradores de um bairro poderão constituir sociedade empresária considerada de pequeno porte (receita bruta anual de R$ 40 milhões), captar o teto de R$ 15 milhões, e destinar os recursos à compra de um terreno para a construção de uma farmácia, fazendo com que os investidores participem dos futuros lucros a serem distribuídos por essa empresa, além da eventual venda.

Um construtor poderá captar investimentos para construir casa em loteamento e destiná-la à venda, repartindo o lucro com os investidores.

Um galpão poderá ser adquirido, reformado e colocado à venda, tudo após a captação via plataforma de crowdfunding.

São exemplos de como esse mercado poderá ser melhor explorado, seguindo o exemplo norte americano (vide Fundrise).

As mudanças normativas acompanham a crescente desta modalidade de investimento que, de 2017 para cá, teve o seu volume captado pelas plataformas multiplicado por 14x, chegando a R$188,3 milhões ao final do ano passado.

O número de plataformas passou de 5 (em 2017) para 56 ao final do ano passado. A lista atualizada com todas as plataformas autorizadas está disponível para consulta no site da CVM.

 

[1] https://www.gov.br/cvm/pt-br/assuntos/noticias/numero-de-investidores-em-crowdfunding-cresce-139-em-um-ano

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