As novas regras de tributação de investimentos no exterior

03/05/2023

Por Vinícius de Barros

A Medida Provisória (MP) n. 1.171, publicada em 30 de abril de 2023, promoveu uma série de alterações nas regras de tributação da renda auferida por pessoas físicas residentes no Brasil em investimentos no exterior. Embora tenha entrado em vigor em 1º de maio de 2023, os efeitos serão sentidos pelos contribuintes apenas a partir de janeiro de 2024, quando as novas regras passarão a ser efetivamente aplicadas.

No entanto, a MP precisa passar por duas etapas cruciais antes de passar a valer de fato. Primeiro, ela precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional dentro de 120 dias, o que pode ser dificultado por pessoas influentes que serão afetadas pelas suas regras mais onerosas. Segundo, a MP pode enfrentar questionamentos judiciais de contribuintes, principalmente em relação à tributação automática de lucros não distribuídos por entidades estrangeiras, uma regra bastante controversa.

De fato, a tributação de lucros auferidos no exterior, sem distribuição para a pessoa física investidora, parece inconstitucional, já que não há fato gerador do IRPF nesta hipótese. Isso se deve à ausência de disponibilidade econômica ou jurídica da alegada renda.

Enquanto isso, as regras estabelecidas pela MP estão em vigor e requerem atenção dos contribuintes que investem ou pretendem investir no exterior, a fim de evitarem problemas fiscais futuros.

Nesse sentido, é importante destacarmos os principais pontos da MP, tais como: as novas alíquotas do Imposto de Renda sobre os rendimentos do exterior; a tributação das aplicações financeiras; a tributação dos lucros de empresas e outras entidades sediadas no exterior; a tributação dos rendimentos de trusts; e a possibilidade de atualização dos bens a valor de mercado.

Elaboramos este artigo para explicar de forma sucinta esses pontos e suas implicações para os contribuintes. Acompanhe a seguir.

As alíquotas do IR sobre os rendimentos do exterior

A partir de 1º de janeiro de 2024, as pessoas físicas residentes no Brasil que possuem investimentos no exterior deverão declarar separadamente na Declaração de Ajuste Anual (DAA) seus rendimentos provenientes de aplicações financeiras, lucros e dividendos de entidades controladas e bens e direitos objeto de trust. Esses rendimentos estarão sujeitos à incidência do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) no ajuste anual, de acordo com as seguintes alíquotas:

I – 0% (zero por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que não ultrapassar R$ 6.000,00 (seis mil reais);

II – 15% (quinze por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que exceder a R$ 6.000,00 (seis mil reais) e não ultrapassar R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais);

III – 22,5% (vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que ultrapassar R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

É importante ressaltar que não será possível deduzir nenhum valor da base de cálculo desses rendimentos.

Já os ganhos de capital obtidos na alienação, na baixa ou na liquidação de bens e direitos localizados no exterior, que não constituam aplicações financeiras, permanecerão sujeitos às regras específicas de tributação dispostas no art. 21 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995. As alíquotas desses ganhos variam entre 15% e 22,5%, dependendo do valor do ganho.

A tributação de aplicações financeiras

A partir de 1º de janeiro de 2024, as pessoas físicas residentes no Brasil que obtiverem rendimentos em aplicações financeiras no exterior deverão declará-los de forma separada na DAA e estarão sujeitas às regras de tributação expostas no tópico anterior.

A MP define quais investimentos devem ser considerados aplicações financeiras, tais como depósitos bancários, cotas de fundos de investimento e depósitos em cartões de crédito, e quais rendimentos devem ser tributados, como a variação cambial da moeda estrangeira em relação à moeda nacional, juros e prêmios.

Esses rendimentos serão incluídos na DAA e estarão sujeitos à incidência do IRPF no período em que forem efetivamente recebidos pela pessoa física, ou seja, no resgate, na amortização, na alienação, no vencimento ou na liquidação das aplicações financeiras. Importante ressaltar que não haverá deduções permitidas na base de cálculo desses rendimentos.

Os lucros de sociedades e outras entidades sediadas no exterior (offshores)

A MP apresenta uma nova sistemática de tributação de investimentos em entidades no exterior controladas por pessoas físicas residentes no Brasil – caso das conhecidas offshores –, que tem causado controvérsia. Essa sistemática provoca a tributação automática dos lucros apurados no balanço das entidades, independentemente da sua distribuição aos investidores.

A definição de entidade controlada pela MP é a sociedade e demais entidades (personificadas ou não) que a pessoa física detiver direta ou indiretamente, (i) isolada ou em conjunto com outras partes, a preponderância nas deliberações sociais ou poder de eleger ou destituir a maioria dos seus administradores ou (ii) isolada ou em conjunto com partes vinculadas, mais de 50% de participação no capital social, ou equivalente, ou nos direitos à percepção de seus lucros ou recebimento de seus ativos na hipótese de sua liquidação.

Até 31 de dezembro de 2023, os lucros apurados pelas entidades controladas no exterior de pessoas físicas residentes no País serão tributados de acordo com a regra vigente, ou seja, o IRPF incidirá quando a controlada disponibilizar o seu lucro para a pessoa física investidora. A partir de 1º de janeiro de 2024, no entanto, os lucros apurados pelas entidades controladas no exterior passarão a ser tributados pelo IRPF segundo as alíquotas mencionadas no tópico “As alíquotas do IR sobre os rendimentos do exterior”, todo dia 31 de dezembro de cada ano, independentemente de sua distribuição.

Importante destacar que as regras da MP só se aplicam às entidades controladas que (i) estejam localizadas em país ou dependência com tributação favorecida ou sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado, ou (ii) apurem renda ativa própria inferior a 80% da renda total.

O novo sistema de tributação previsto na MP impõe aos contribuintes a necessidade de reavaliarem esse formato de investimento no exterior por meio de companhias offshore, prática comumente adotada por investidores brasileiros.

A tributação dos rendimentos de Trusts

A MP trouxe a regulamentação dos trusts no Brasil, que são estruturas jurídicas comumente usadas em países anglo-saxônicos para transferir bens ou recursos para outra pessoa ou entidade, chamada de trustee, que os administra em benefício de terceiros, os beneficiários. Entre as finalidades do trust estão o planejamento sucessório, tributário e a proteção de ativos.

A partir de 1º de janeiro de 2024, os rendimentos e ganhos de capital relativos aos bens e direitos objeto do trust serão tributados pelo IRPF pelo respectivo titular, de acordo com as regras já expostas neste artigo.

A atualização dos valores a mercado

Por fim, destaca-se a previsão da MP que possibilita aos contribuintes pessoa física residentes no país a opção de atualizar para 31 de dezembro de 2022 o valor de mercado dos seus bens e direitos no exterior, declarados na DDA, e tributar a diferença entre o valor de aquisição e o de mercado, pelo IRPF, com a alíquota definitiva de 10% (dez por cento).

A MP traz um benefício fiscal aos contribuintes, visto que a tributação da valorização dos bens e direitos, quando realizada, é sujeita a uma alíquota progressiva de 15% a 22,5% de IRPF sobre o ganho de capital.

São passíveis de atualização os valores de aplicações financeiras, bens imóveis (ou ativos representativos), veículos, aeronaves, embarcações, bens móveis sujeitos a registro, participações societárias e bens de trust que a pessoa física seja titular. Porém, não poderão ser objeto de atualização os bens ou direitos que não tenham sido declarados na DAA referente ao ano-calendário de 2022, bens ou direitos que tenham sido alienados, baixados ou liquidados antes da formalização da opção, bem como joias, pedras e metais preciosos, obras de arte, antiguidades de valor histórico ou arqueológico, animais de estimação ou esportivos e material genético de reprodução animal, sujeitos a registro em geral, mesmo em alienação fiduciária.

O imposto incidente sobre a atualização deve ser recolhido até o dia 30 de novembro de 2023.

Em relação às controladas no exterior, a pessoa física que optar pela atualização do valor até 31 de dezembro de 2022 pode escolher, separadamente, atualizar o valor de mercado no período de 1º de janeiro de 2023 a 31 de dezembro de 2023, com pagamento do IRPF pela alíquota definitiva de 10% (dez por cento). Nesse caso, o imposto deve ser pago até o dia 31 de maio de 2024.

Ressalta-se que a forma de adoção desta opção ainda será regulamentada pela Receita Federal do Brasil.

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