A pesquisa de bens imóveis dos devedores é uma das diligências mais frequentes realizadas pelos credores para encontrar patrimônio capaz de satisfazer a dívida perseguida nos processos de execução. Contudo, os devedores estão cada vez mais criativos na tentativa de blindagem de seu patrimônio, sendo manobra comumente utilizada o não registro da compra e venda na matrícula imobiliária.
A busca de bens imóveis é realizada pelo nome e CPF (ou CNPJ, se pessoa jurídica) do devedor, em diversos Cartórios de Registro de Imóveis do País. Entretanto, se o executado não registra a transação, fica praticamente impossível ao credor saber da existência daquele bem.
Em tal momento é necessária a diligência do credor para identificar onde estão os ativos do devedor, por exemplo, por meio de pesquisas em redes sociais e outros dados públicos dos executados, e comprovar ao juiz do processo que o bem é indubitavelmente do devedor e a inércia no registro da matrícula do imóvel se trata, na verdade, de uma blindagem patrimonial.
Em quatro processos recentes patrocinados pelo Teixeira Fortes, após essas pesquisas extrajudiciais foram identificados imóveis que não estavam em nome dos devedores, mas que, sem qualquer dúvida, eram deles.
Em dois deles, a blindagem foi constatada após a análise de processos dos devedores, sendo que a construtora e o condomínio informaram a compra e venda do bem pelo executado, mas, quando analisada a matrícula, verificava-se que o imóvel ainda era de propriedade do primeiro comprador.
Em outros dois processos, as comprovações vieram após a análise das declarações de imposto de renda dos devedores, juntamente com a pesquisa nas redes sociais. Publicações de fotos do executado no apartamento, além da confirmação pela administração do condomínio ou pelo oficial de justiça de que o devedor reside lá, são uma clara comprovação de que o bem é do executado, mas não está registrado em nome dele apenas e tão somente para fraudar as execuções.
Certo é que, com lastro nos artigos 789 [1] e 835, XIII [2] , ambos do Código de Processo Civil, é possível a penhora de eventuais direitos que o devedor detenha sobre o imóvel, sendo que o proprietário registrado na matrícula pode inclusive ser intimado a não transferir o bem para terceiro estranho ao processo, caso seja solicitado pelo devedor. Com isso, o executado não consegue se livrar do imóvel sem que antes o credor seja intimado para concordar ou não com a transferência.
Em processo recentemente julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, a 3ª Turma proferiu uma decisão exatamente neste sentido: é possível a penhora sobre direitos aquisitivos decorrentes do contrato de promessa de compra e venda, mesmo quando ausente o registro do contrato. Na decisão do Recurso Especial nº 2.015.453/MG, a Ministra Nancy Andrighi entendeu que:
[…] 5. Entre as inúmeras inovações do CPC/15 em relação à fase executiva dos processos judiciais, encontra-se a expressa permissão de penhora dos direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia (art. 835, inciso XII).
6. Importa destacar que, nesta hipótese, a penhora não recai sobre o bem objeto do contrato, mas sobre os direitos identificáveis e avaliáveis que derivam da relação obrigacional firmada entre as partes (ALVIM, Angélica A. Comentários ao código de processo civil [livro eletrônico]. 2. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2017) […]
10. Diante do exposto, não há que se confundir as situações supramencionadas. A penhora sobre os direitos aquisitivos, portanto, incide sobre os direitos de caráter patrimonial decorrentes da relação obrigacional (promessa de compra e venda) e não sobre a propriedade do imóvel.
11. A autorização conferida pela lei para a penhora de direitos independe, inclusive, da existência de registro do contrato de promessa compra e venda.
12. No ponto, frisa-se que, a despeito das hipóteses de impenhorabilidade, a penhora pode recair sobre quaisquer direitos de natureza patrimonial, sem que seja feita qualquer ressalva legal ou exigência especial em relação aos direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda (art. 835, XII, do CPC/15). […]
16. Desse modo, tem-se que o credor dos direitos aquisitivos penhorados os adquirirá no estado em que se encontrarem, sejam de caráter pessoal, sejam real. Não obstante, a conclusão que se impõe é que a mera ausência do registro do negócio jurídico não impede o exercício da penhora […]
19. Em atenção ao exposto, conclui-se que a penhora de direitos aquisitivos decorrentes de contrato de promessa de compra e venda independe de registro do negócio jurídico. […]
Diante de todo o exposto, resta claro que os credores precisam ser cada vez mais diligentes e criativos para encontrar os bens dos devedores que estão comumente blindados. Por isso, as pesquisas extrajudiciais muitas vezes trazem resultados ao processo e, se estes resultados e a exposição dos fatos e documentos forem bem explorados ao juiz, é possível comprovar a fraude à execução e penhorar o bem blindado.
[1] Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.
[2] Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: […] XIII – outros direitos.
04 outubro, 2024
16 setembro, 2024
28 agosto, 2024
27 agosto, 2024
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