O resumo da ópera da MP da tributação dos fundos de investimento

08/09/2023

Por Cylmar Pitelli Teixeira Fortes

Para cumprir a ambiciosa meta de zerar o déficit fiscal no curto prazo (em 2024), e com o argumento de tornar mais isonômicas as regras do imposto sobre a renda no País, a Medida Provisória 1.184 equiparou a tributação dos fundos exclusivos à dos fundos de investimento em geral. Passados alguns dias desde a edição da MP, convém fazer um apanhado geral para sintetizar o que ela trouxe em seu bojo, e traçar algumas perspectivas do que poderá ocorrer daqui para frente.

É que, de acordo com a legislação atual, os fundos exclusivos somente têm seus rendimentos tributados no momento do resgate, e a MP estabelece o regime do “come-cotas” também para os fundos fechados (maio e novembro), trazendo outras medidas.

Como é sabido, a MP precisará ser convertida em lei após apreciação de ambas as casas do Congresso Nacional, em 60 dias, prorrogáveis por mais 60, e deverá ser promulgada posteriormente pelo Presidente da República.

Eis aqui um overview na nova norma.

 

Tributação do “estoque” de rendimentos

 

Já apontamos a inconstitucionalidade em artigo específico publicado anteriormente. Clique aqui.

De acordo com a regra trazida pela MP, o estoque será tributado no primeiro come-cotas em maio de 2024, conforme classificação do fundo, podendo ser parcelado em 24 vezes com atualização pela SELIC. A MP traz a alternativa de recolhimento, à alíquota de 10%, em duas etapas:

(i) sobre os rendimentos apurados até junho/2023, em 4 parcelas iguais (dezembro de 2023 a março de 2024); e

(ii) sobre os rendimentos apurados entre julho/2023 até dezembro/2023, à vista, em maio/2024.

Há quem aposte que o Governo lançou a alíquota alternativa de 10% como um balão de ensaio para testar a resistência do Congresso, mas que na verdade estaria disposto a aceitar uma alíquota ainda menor do que aquela de 6% (seis por cento) que havia sido proposta pela gestão do ex-ministro Paulo Guedes no Ministério da Fazenda.

O cerne da questão é que a chamada tributação do estoque é de uma inconstitucionalidade tão primária, que o que será levado em conta pelos gestores não é a juridicidade (constitucionalidade ou inconstitucionalidade) da cobrança, que os juristas são uníssonos em negar, mas o cálculo puramente financeiro: se em algum momento o fundo deverá, de qualquer forma, pagar a alíquota padrão, não faria sentido, do ponto de vista estritamente financeiro, antecipar esse pagamento agora, mercê do relevante desconto concedido?

Em suma, é possível que a tributação do estoque seja aprovada, apesar de ser uma aberração jurídica, mas se o for possivelmente o será com uma alíquota bastante reduzida, de tal sorte que a decisão dos gestores se pautará no cálculo estritamente econômico-financeiro.

Vale dizer: ou o Congresso derruba a tributação do estoque, tal como concebida pela MP 1.184, ou o Judiciário certamente derrubará. Nessa matéria de tributação do estoque especificamente, não há espaço para decisão política ou algo que o valha.

 

Regra Geral

 

O come-cotas semestral incidirá sobre os rendimentos dos fundos fechados segundo as mesmas alíquotas já existentes para os fundos abertos (15% para longo prazo, 20% para curto prazo). Foram mantidas as alíquotas regressivas (diferenciação de longo prazo e curto prazo). Para fins de contagem de prazo da alíquota regressiva, o mecanismo permanece o mesmo, ou seja, a contagem é feita por cada aporte.

 

Fundos específicos

 

FIPs, FIAs e ETFs

Quando considerados “entidades de investimento”, esses fundos permanecem tributados apenas por ocasião da amortização e resgate das cotas. Para ser considerado uma “entidade de investimento”, o fundo deve ter gestão profissional, vale dizer, ser representado por agentes ou prestadores de serviços com poderes para tomar decisões de investimento e desinvestimento de forma discricionária, na forma estabelecida pelo CMN.

Quando não forem considerados “entidades de investimento”, haverá incidência do come-cotas, podendo ser excluída a receita de avaliação a valor justo dos ativos de renda variável ou de equivalência patrimonial em investidas, para fins de apuração do imposto sobre a renda, sendo que esses resultados somente serão tributados na realização/venda dos ativos, desde que essa reavaliação seja controlada em subconta específica.

No que toca aos FIIs e FIAgros, a regra de isenção de distribuição de rendimentos listados subiu de 50 para 500 cotistas.

Os Fundo de Fundos (FoFs) obedecerão a natureza dos mesmos fundos investidos.

Quanto ao usufruto em fundos, a tributação observará a natureza do beneficiário do rendimento.

Diferentemente de outros projetos de lei já discutidos no Congresso Nacional, não há proposição para que os FIPs “Patrimoniais” sejam tributados como pessoas jurídicas.

 

Reorganização societária de fundos

 

As fusões, cisões, incorporações ou transformações de fundos são eventos tributáveis a partir de 01.01.2024.

As reorganizações envolvendo FIAs, FIPs e ETFs, desde que enquadrados como “entidades de investimento”, como definidas acima, não são eventos tributáveis.

Os fundos poderão se reorganizar (mediante cisão, incorporação, fusão ou transformação) para acomodar as novas regras, com neutralidade tributária, desde que:

(i) não estejam sujeitos ao “come-cotas” no ano de 2023; e

(ii) as alíquotas para o fundo migrado sejam iguais ou superiores à alíquota atual.

 

Não residentes

 

Em linhas gerais, as regras para investimento de não residentes se mantém.

Estaremos acompanhando a evolução do tema para manter os leitores do nosso boletim informados.

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