STJ: leilão extrajudicial de garantia fiduciária deve observar o mínimo de 50% do valor de avaliação do imóvel

20/06/2024

Por João Paulo Ribeiro Cucatto

Ao julgar o Recurso Especial nº 2.096.465/SP, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que é proibida a arrematação de imóvel por valor inferior a 50% do valor de avaliação do bem. Segundo o STJ, são aplicáveis ao procedimento de excussão da garantia fiduciária as normas gerais de direito que proíbem o enriquecimento sem causa se prestam a garantir a mitigação dos prejuízos do devedor. O julgado recebeu a seguinte ementa:

“Mesmo antes da vigência da Lei nº 14.711/2023, é possível a invocação não só do art. 891 do CPC/2015, mas também de outras normas, tanto de direito processual quanto de direito material, que i) desautorizam o exercício abusivo de um direito (art. 187 do Código Civil); ii) condenam o enriquecimento em causa (art. 884 do Código Civil); iii) determinam a mitigação dos prejuízos do devedor (art. 422 do Código Civil) e iv) prelecionam que a execução deve correr da forma menos gravosa para o executado (art. 805 do CPC/2015), para declarar a nulidade da arrematação a preço vil nas execuções extrajudiciais de imóveis alienados fiduciariamente.”

O art. 27, §2º, da Lei nº 9.514/97, com a redação incluída pelo Marco Legal das Garantias, autoriza que o credor fiduciário aceite, no segundo leilão, lance que seja equivalente à metade do valor de avaliação do bem, no mínimo. Essa previsão segue a mesma orientação contida no parágrafo único do art. 891 do Código de Processo Civil.

Na redação anterior, a lei determinava que o lance no segundo leilão deveria ser igual ou superior ao valor integral da dívida garantida, acrescida de outras despesas, como emolumentos, tributos e contribuições condominiais. A título de exemplo, essa situação poderia autorizar que um imóvel avaliado em R$ 1 milhão fosse leiloado por R$ 100 mil, se este fosse o valor da dívida, acrescido dos encargos previstos na lei.

No caso analisado pelo STJ, a dívida principal era de aproximadamente R$ 27 milhões, enquanto o imóvel havia sido avaliado em cerca de R$ 85 milhões. Em razão do inadimplemento, foi iniciada a execução extrajudicial da garantia e, no segundo leilão, o imóvel foi arrematado por R$ 33 milhões.

Ainda que o valor obtido com a venda fosse suficiente para o pagamento da dívida, a arrematação foi anulada porque o lance correspondia a menos de 40% do valor do imóvel. Segundo o STJ, se essa situação fosse admitida, ela resultaria no enriquecimento sem causa em favor do adquirente e em violação ao princípio da menor onerosidade em relação ao devedor.

Já no caso de ausência de lances, o artigo 27, §5º, da Lei nº 9.514/97, autoriza que o credor fiduciário fique investido na livre disponibilidade do imóvel, e não será obrigado a restituir ao devedor qualquer importância. Leia-se, a esse respeito, artigo de autoria do advogado Mateus Matias Santos (“Alienação Fiduciária de Imóvel: TJSP reafirma que credor fiduciário não deve restituir valores após leilão sem arrematação”), que explora a situação específica das consequências do leilão sem arrematação.

O julgamento do Recurso Especial nº 2.096.465/SP reforça a importância de os contratantes atribuírem à garantia fiduciária valor compatível com a sua avaliação, assim como estipular de forma expressa os critérios para a revisão do valor, na forma do que exige o artigo 24, VI [1], da Lei nº 9.514/97.

É fundamental que o credor fiduciário compreenda as implicações financeiras e legais relacionadas ao valor estabelecido para a execução garantia fiduciária. Ao estipular o valor adequado da garantia e as regras para a sua revisão, o credor mitigará os riscos associados a potenciais litígios que pretendam discutir a legalidade da execução extrajudicial.

 

[1] Art. 24. O contrato que serve de título ao negócio fiduciário conterá: VI – a indicação, para efeito de venda em público leilão, do valor do imóvel e dos critérios para a respectiva revisão.

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